APL 3551 A lenda do Conde de Ariães

Havia antigamente um castelo, numas terras de campo, além ao descer aquele cabeço para Bragança, onde vivia o Conde de Ariães. Já lá não há nada, mas eu ainda tenho na lembrança de ver lá vestígios desse castelo. O Conde de Ariães vivia então nesse castelo, onde tinha uma gruta com dois grandes leões. Com ele morava a sua mãe e também uma moça que se chamava Alcina, de quem ele gostava muito e com quem pensava organizar casamento.
    Nessa altura, na Serra da Nogueira, que também não é muito longe daqui, havia outro castelo e também outro conde. Era o Conde Redemiro. Mas esse era uma pessoa diferente. Era mau. Tão mau que até exigia umas sete ou oito donzelas todos os anos para o castelo dele, para as ter lá ao seu dispor. E tinha muitos ciúmes pela moça do Conde de Ariães. Um dia, organizou uma batalha com ele. O Conde de Ariães foi para a batalha, mas como o outro tinha mais homens, ele perdeu-a. E o pior ainda e que enquanto o Conde de Ariães andava na batalha, o Conde Redemiro veio cá e raptou-lhe a Alcina. Levou-a para o castelo dele. A mãe deu conta mas, coitadinha, era uma velha como eu, que é que podia fazer? Nada fez.
    Depois, o Conde de Ariães, perdida a batalha, vem para casa, e a mãe diz-lhe:
    — Meu filho, vens muito triste, pois perdestes a batalha! Mas olha, ainda tens um desgosto maior. Sabes que te roubaram a tua Alcina?
    Ele então é que ficou!... Ficou tão desnorteado, que, para se vingar da mãe, pois culpou-a de ter deixado raptar a noiva, atirou-a à gruta dos leões. Já vê o que lhe aconteceu: dois leões botados assim numa velha como eu!... Pronto, mataram-na.
    Mais tarde ele arrependeu-se. Pegou então na espada e matou os leões. A um cortou-lhe logo a cabeça. Por isso há ali duas estátuas com dois leões onde um está sem a cabeça.
    Mas mesmo assim não ficou em paz. Os remorsos eram muitos. Foi então pedir aos monges deste mosteiro, que era o mosteiro do Castro de Avelãs, que lhe dissessem que castigo deveria receber para obter o perdão por ter deixado que a mãe fosse devorada pelos leões. E o que lhe disseram eles? Que fizesse um túmulo e que criasse uma serpente para que depois o devorasse também a ele, tal como deixou devorar a mãe. Ele assim fez. Criou uma serpente e sepultou-se com ela no túmulo.
    Neste meio tempo, quando o conde estava já no túmulo, travou-se uma batalha entre cristãos e mouros na Serra da Nogueira, onde os cristãos mataram o Conde Redemiro. E mal o matam, a Alcina viu-se livre e fugiu para cá. Só que quando chegou cá o conde estava já sufocado. Diz-se que ainda trocaram palavras, em que ela lhe dissera que nunca tinha tido nada com o Conde Redemiro, que lhe guardou sempre fidelidade.
    Ele então, devorado pela serpente, morreu. E ela com o desgosto, e com os “ais” que deu, morreu também junto dele.
    Diz o povo que os “ais” que a Alcina deu eram tão grandes, tão grandes, que se ouviam nas terras ao redor. E uma dessas terras ficou até com o nome Grandais, por causa dos “grandes ais” que se ouviam.

Source
PARAFITA, Alexandre A Mitologia dos Mouros: Lendas, Mitos, Serpentes, Tesouros Vila Nova de Gaia, Gailivro, 2006 , p.218-220
Year
2004
Place of collection
Castro De Avelãs, BRAGANÇA, BRAGANÇA
Informant
Cândida dos Santos Diegues (F), 82 y.o.,
Narrative
When
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography