APL 1008 O contrabandista e os trasgos

Um contrabandista de uma aldeia fronteiriça costumava queixar-se dos trasgos.
Andava constantemente atormentado por eles e, sempre que alguma coisa de mal que lhe acontecia, atribuía-lhes a culpa.
Assim, se era apanhado pela guarda quando tentava passar um saco de café ou umas caixas de cigarros para o outro lado, eram os trasgos os culpados. Quando, na sua fuga por caminhos de cabras ou por corta mato com o saco do contrabando às costas, ouvia barulhos suspeitos, eram os trasgos que o queriam assustar. E nessas alturas os cabelos arrepiavam-se-lhe todos. Alguém lhe disse um dia que os tragos não eram espíritos maus e que ele seguisse o caminho como se nada fosse. Bem piores eram os
lobos e os homens e desses é que ele deveria precaver-se.
Mas o homem não havia maneira de se convencer disso. E como o medo aos trasgos era enorme, alguém o aconselhou a ir falar a uma velha que tinha fama de feiticeira. Esta deu-lhe um amuleto que o livraria dos trasgos e em paga pediu-lhe um saco de café. Ele achou caro, pois uma meia com trovisco também ele a podia arranjar e de graça. Mesmo assim pagou o serviço, não fosse a velha deitar-lhe algum mau olhado.
Atou o amuleto ao pescoço com uma guita e a partir daí passou a fazer o serviço sem preocupações de maior. Imaginando-se livre dos trasgos, achou que estava livre também de todos os perigosos e passou a desleixar a vigilância ao longo do caminho.
Uma alcateia de lobos, que o andava a espreitar há várias noites, atacou-o e com ele fez a ceia.
Os trasgos daquela aldeia ficaram com a fama injusta de terem sido os causadores da morte do contrabandista.

Source
AA. VV., - Literatura Portuguesa de Tradição Oral s/l, Projecto Vercial - Univ. Trás -os-Montes e Alto Douro, 2003 , p.HD12
Year
2000
Place of collection
CHAVES, VILA REAL
Collector
José Leon Machado (M)
Informant
Abílio Cortez Cabrera (M), 63 y.o., CHAVES (VILA REAL),
Narrative
When
20 Century, 90s
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography