APL 728 A procissão das luzes em Sabroso
À volta da igreja de Sabroso havia lá procissões de noite. Chegavam à porta principal, faziam a vénia e tornavam a seguir. Quem dizia isso eram os que iam p’ra Moimenta da Beira, porque havia lá todos os quinze dias uma feira. Uma era a feira do mês e outra a feira dos quinze. E então tinham de passar na estrada de cima, mas viam Sabroso em baixo. E iam muito cedo, porque iam a pé.
E viam então andar lá essas luzinhas acesas e outras apagadas. Dizem que são pessoas que, às vezes, vão à procissão e que não a acabam. Ao ir-se tem de se cumprir. Ou então não se ir. Se não, depois quando morrem têm de vir cá fazer a penitência.
Eu, quando não vou, não vou. Mas quando vou, faço tudo. E lembra-me muito um senhor que havia na nossa terra, chamávamos-lhe o Zé Rato. Morreu em Lisboa, mas também está aqui [e aponta para o cemitério]. Ele quebrou as duas pernas, também já tinha uma certa idade, e andava com uma bengalinha. Custava-lhe muito a andar.
E então que fazia? Ia antes da procissão sair. Porque não aguentava depois a procissão a ir ao cimo da vila, a ir ao fundo e à igreja. Nesse tempo, havia as procissões no Coração de Jesus, no Corpo de Deus, no dia da Senhora da Conceição, no dia de S. José.
E então ele lá ia com o vagarinho dele. Quando nós nos encontrávamos ali para o cimo da vila, já ele vinha p’ra baixo, amparadinho à bengalinha: tuca, tuca, tuca. Ia ao fundo, quase até à porta dele, vinha p’ra cima e esperava-nos na igreja.
Eu sabia ao que ele ia. Porque ele dizia-me:
— Eu não posso ir, porque depois dá-se isto assim, assim... E então eu vou diante e depois entro p’rá igreja convosco.
Ele tinha receio, de depois de morrer, cá vir acabar de fazer a procissão.
- Source
- PARAFITA, Alexandre Património Imaterial do Douro - Narrações Orais (contos, lendas, mitos) Vol. 1 Peso da Régua, Fundação Museu do Douro, 2007 , p.131
- Place of collection
- Barcos, TABUAÇO, VISEU
- Collector
- Alexandre Parafita (M)
- Informant
- Maria Isabel Araújo (F), 76 y.o., Barcos (TABUAÇO),