APL 2915 [remoinhos]
Antigamente, havia muitos remoinhos. Hoje, já quase não se vêem e quando acontecem são pequenos. Já nada é como dantes. Num dia de verão, andava eu mais três homens numa eira a malhar pão. Estava muito calor mas olhe que não fazia vento. E, dum momento para o outro, num dos cantos da eira levantou-se um remoinho que nos deixou a todos admirados.
Começaram a andar à roda, à roda, folhas misturadas com grãos rentinhos ao chão. A pouco e pouco, a roda foi-se alargando e iam-se juntando cada vez mais palhas, grãos e poeira. Aquilo tudo misturado, começou, começou a subir e a andar às voltas à eira.
Quanto mais voltas dava, mais palha, grãos e poeira levava e mais alto se elevava.
Olhe, tantas voltas deu à eira que chegou ao pé de nós. Foi então quando nós deixámos de malhar, fizemos o sinal da cruz e dissemos: «Nosso Senhor nos veja e o diabo cego seja!.» Ainda não tinhamos acabado de orar, já o remoinho se estava a afastar de nós e a ficar cada vez mais estreito e a subir, a subir para o astro até que se sumiu lá no alto.
Se não fosse o sinal da cruz e as orações a pedir para que o diabo fosse cego, não nos visse, o remoínho tinha-nos metido no meio e levava-nos de certeza.
- Source
- SALVADO, Maria Adelaide Neto Remoínhos, Ventos e Tempos da Beira s/l, Band, 2000 , p.36-37
- Year
- 1994
- Place of collection
- Vila Velha De Ródão, VILA VELHA DE RÓDÃO, CASTELO BRANCO
- Collector
- Cristina Maria Martinho (F)
- Informant
- Joaquim Jorge Machado (M), 79 y.o.,