APL 1225 Uma romeira da Senhora dos Anjos

Nos finais do século dezasseis e durante o século dezassete, havia muitos devotos da Senhora dos Anjos e ia muito povo em romaria lá no dia quinze de Agosto, aniversário da chegada de Gonçalo Velho à Praia dos Lobos, mesmo ali ao lado. No tempo da Quaresma também era costume as mulheres muito religiosas irem ao Calvário, onde tinha a Cruz dos Anjos, fazer as suas orações e havia mesmo algumas que iam de freguesias distantes, todas as semanas, rezar à Senhora dos Anjos.
 Uma senhora rica de Vila do Porto costumava também ir rezar ao dito lugar uma vez por semana. Levantava-se muito cedo, sem que o marido desse pela sua falta e punha-se a caminho sozinha.
 Esta família tinha um feitor que todos os dias se levantava de madrugada para ir tratar do gado. Um dia, ainda lusco-fusco, quando ia pelo caminho para ir tratar dos animais, encontrou a patroa à Senhora da Saúde para cima. Ficou muito admirado de a ver ali, sozinha, a pé, longe de casa, àquela hora da madrugada e perguntou com voz espantada:
 — Eh senhora, a senhora que faz aqui?
 Assim que pronunciou estas palavras e sem que tivesse tido resposta, a patroa desapareceu perante os olhos do feitor. Estupefacto, ele pôs-se a pensar no que tinha acontecido. Ainda ficou a matutar se devia ir dizer ao patrão, mas não lhe foi contar o sucedido porque ele ia pensar que estava a dizer uma mentira e não o acreditava mais.
 Tinha sido a Senhora dos Anjos a interceder pela sua devota para que o marido não a castigasse nem a proibisse de fazer as suas romarias.
 Assim, aquela senhora rica de Vila do Porto continuou a ser romeira certa da Senhora dos Anjos e sempre ia lá rezar todas as semanas enquanto teve forças para fazer a viagem a pé.

Source
FURTADO-BRUM, Ângela Açores: Lendas e outras histórias Ponta Delgada, Ribeiro & Caravana editores, 1999 , p.39-40
Place of collection
VILA DO PORTO, ILHA DE SANTA MARIA (AÇORES)
Narrative
When
17 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography