APL 1752 [O lobisomem]

Era o meu bisavô que tinha ido ver uma pessoa de família mais a bisavó. Bisavó…? É mais do que bisavó, que eram já avós dos bisavós do meu pai.
 E, depois, pelo caminho, vinha pelo caminho e ele disse assim à mulher:
— Vai lá andando, que eu tenho que ir aqui verter as águas! (Dizia aquilo quando ia urinar).
E a mulher diz que veio andando e ele ficou atrás a urinar. Ela diz que viu aquele canito pequenino indo de roda, de roda, de roda e ela a enxotá-lo e o canito vai e sempre lhe jogou a boca à saia e fez uma farpazinha na saia. Era saia…estremenha . Parece-me que era o que o meu pai dizia que usavam no outro tempo. Uma espécie de lã.
E, então, ficou com um fio da saia nos dentes. E depois, quando ele chegou ao pé, diz ela:
— Ah! Ficaste atrás, demoraste tanto tempo! Apareceu aqui um canito. Olha, não me dei desenvencilhada dele! Fez-me aqui uma farpazinha na saia.
E [ele] riu-se e ela viu-lhe o fio da saia nos dentes. Desconfiou:
— Ai, eras tu!? És lobisomem, então espera!
E o que fez? Tirou-lhe o fadário.
Na noite, comprou a roupa toda (ainda hoje existe lá o forno! Tinham na frente da porta deles). Comprou uma farda toda, tudo, tudo: botas ou sapatos (não sei o que usava) e a roupinha toda. E, depois de se ir deitar, quando ele estava dormindo, pôs com aquilo tudo [a roupa e os sapatos]  dentro do forno e atiçou o fogo e fechou-lhe a porta. Deu um estoiro tão grande, que o forno desborralhou  todo.
Quando ele acordou, já não era lobisomem. Já lhe tinha tirado o fadário. 

Source
REIS, Elisabete Andrade Uma viagem pela literatura oral de Maria do Carmo Martins Faro, Universidade do Algarve, 2005 , p.Texto nº 27
Year
2004
Place of collection
Alte, LOULÉ, FARO
Informant
Maria do Carmo Martins (F), 74 y.o., Quarteira (LOULÉ), born at Alte (LOULÉ),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications
Types
Christiansen [4005] O marido lobisomem

Bibliography