APL 1876 A Morte de Jesus Cristo
Deus, quando o crucificaram. Ele fugiu à morte, foi-se esconder a um horto e a judiaria andavam-no a buscar e uma velha que era da judicaria também (assim velha como eu), e disse-lhe:
— Andais a buscar o ladrão? Vimo-lo ali naquele horto, que anda a colher couves, anda a roubar, anda a colher couves!
Foi, donde o foram agarrar foi à horta, donde lhe puseram um grande madeiro em cima e arrastavam-no preso por uma corda e ele com o madeiro em cima e fazerem-no anarizar. Tudo p’los nossos martírios, p’los nossos pecados, Pai do Céu! Despois ia todo suado, quando os judeus o levavam e foi Verónica, mulher, e disse-lhe:
— Limpa-me, limpa-me, Madalena!
Logo lhe ficou o rosto dele estampado no pano, donde Madalena o limpou. Seguiu a sua crucificação até ao Calvário, donde despois foi levantado um grande madeiro, cravado de pés e mãos, com..., com pregos, com cravos, cravados nos pés e nas mãos. E Nossa Senhora a ver cravar o seu bendito Filho, devagando lágrimas. Depois disseram-lhe, então, que ela que não era Nossa Senhora que era uma mulher como as outras que fora, que fora criada por obra e graça, mas eles não acreditaram, diziam que fora mulher mundana, como as outras e chamaram-lhe puta (digo assim mesmo, porque foi o que lhe chamaram). E chamaram-lhe puta. E agora Deus que de tudo deixou no mundo:
Há putas, porque na hora em que lhe chamaram a Nossa Senhora mulheres mundanas ficaram. E há ladrões, porque foi a coisa que lhe chamaram a Nosso Senhor, ladrões deixaram. Desgraçadas as horas em que nascem certas criaturas, porque quando nasce uma criatura nessas horas, nasce com o destino que Nosso Senhor lhe põe. Por isso é que não podemos dizer nem aquele é mau nem aquele é bom, porque nasce com aquele destino. Subindo à cruz, pregado de pés e mãos, Sua Mãe bendita, voltando lágrimas. Despois S. José e Nicodemo, quando foi pró baixar da cruz pediu-lhe:
— Minha Senhora, baixamos o teu filho da cruz?
E ela disse-lhes que sim, que o baixassem.
— Pois, com tu permisso, Senhora, nós o baixaremos.
Entregaram-lh’a coroa de espinhos e pregos e tudo a Nossa Senhora e botaram-nos numa cestinha, donde o sepultaram, num sepulcro tal e qual como uma pessoa pecadora. E Nossa Senhora ajoelhou diante do seu bendito Filho, coberta de luto. Donde òsdespois foram enterrar. Foram-no enterrar e botaram-lhe umas grandes pedras em cima. Nosso Senhor era prometido ao terceiro dia ressuscitar, ressuscitar e vir ao Mundo, e ressuscitou. Levantou-se de sepulcro. Foram ver, viram umas pedras levantadas, umas pedras muito grandes. Não acreditavam que ele se levantava dali, mas como era imenso, e Deus tinha todo o poder, levantou-se. Depois, então, vieram dar notícia que Nosso Senhor tinha ressuscitado e eles despois não acreditavam e foram ver o sepulcro; donde então viram que ele se levantara e viera ao Mundo. Donde òsdespois, quando foi dia de Páscoa, apareceu aos seus discípulos, que são uns padres, e fazendo a ressurreição como a faz. Não sei se é em todos os sítios, se é só nalguns. Se calhar lá pra baixo não se faz isso, a ressurreição, que ressuscitou Nosso Senhor. Ao segundo dia ressuscitou e subiu-se ao Céu para nunca mais morrer. Fazei estas exéquias para que o povo saiba qu’havia um Deus que nos domina. Certas pessoas não querem acreditar. Tenho a minha fé e ninguém ma tira. Ninguém ma tira por uma coisa nem por outra. Tenho a minha fé e co ela chegarei até à morte. Não sou eu já tão nova. Estarei até nos fins da minha vida, mas a minha fé ninguém ma tira. E sem Deus, nada! Sobre Deus tudo! E àquele que diga que não há Deus e que Deus que não é imenso, não é boa pessoa, não é Cristão!
- Source
- SOROMENHO, Alda e Paulo Contos Populares Portugueses (Inéditos) I Volume Lisbon, Centro de Estudos Geográficos / INIC, 1984 , p.256-257
- Year
- 1975
- Place of collection
- Montouto, VINHAIS, BRAGANÇA
- Informant
- Maria Danta (F), 86 y.o., Montouto (VINHAIS),