APL 1439 Lenda de Nossa Senhora do Monte
Era uma vez uma menina que se chamava Hélia Prisca. E era muda e surda. E a mãe não a podia educare na religião cristã. E o pai era ateu. Não acreditava. Mas a mãe, por sinais ou assim, fez-le compreender à filha que havia um Deus que havia d'adorare. E a filha compreendia isso tamém.
Uma noite a rapariga até estava na cabana. Tinha doze anos e ela era pastora. Estava na cabana no dia 14 para o dia 15 de Agosto e via as estrelas muito mais brilhantes qu'outros dias. E via que a natureza que não estava como estava outras vezes. E antão o que ela faz? Continuou a orare segundo tinha percibido por sinais, e a admirar a natureza. No dia 14, no meio-dia mesmo, era no dia 14 d'Agosto. [Sabe o que é uma giesta, não sabe? M.C.F.: É uma árvore.] E as giestas dão flor é na Primavera, em Março ou Abril. Parece que é em Abril qu'elas dão flore. E vê uma giesta florida e a imagem de Nossa Senhora em cima da giesta. Quando ela viu a giesta florida e a imagem em cima da giesta, ficou assim como assustada de Nossa Senhora, que le disse:
--Não t'assustes--diz. Não t'assustes. Bai à povoação e diz pà gente da povoação vir aqui, que eu quero que me facem aqui uma ermida.
E ela respondeu. Diz:
--Mas como é qu'eu hei-d'ire, s'eu tenho as minhas ovelhas?
E diz assim ela, diz:
--Eu fico-te co'as ovelhas--diz Nossa Senhora. --Eu fico-te co'as ovelhas.
E a rapariga, que nunca tinha falado, chegou à aldeia e falou. E as pessoas acreditaram logo. Diz:
--Olhai, isto é verdade, porque ela era muda e surda--que ela nunca tinha falado na vida--e agora está a conversar, está a falare.
E quando as pessoas chegaram ali, agarraram a imagem e levaram para a igreja da povoação.
Mas no dia a seguir, quando se levantaram, já não 'tava lá. E foram à procura da imagem, mas não a encontravam. Lá alguém teve a ideia que talvez estivesse no mesmo sítio onde a tinham encontrado. Quando foram lá, estava em cima da giesta.
Ora, foi milagre a pequenita ouvire e falare. Foi milagre a giesta florida naquele tempo--naquele tempo não há nenhuma florida. Foi também milagre a imagem saire e estar no mesmo sítio, não é?
Pois três vezes levcaram a imagem prà igreja e três vezes se repetiu a mesma cena.
E antão a pastorita também dizem que tinha sede e ali se fez um nascente ao pé da giesta. Que não havia antes. E então as pessoas viram que Nossa Senhora, que era mesmo verdade o que ela tinha dito à Hélia Prista.
Mas a menina não estava baptizada. E então Nossa Senhora disse-l'aquele dia:
--Tu hoje ficas baptizada. E o teu nome d'hoje em diante é Maria Luzia--trocou-lhe o nome. --É Maria Luzia.
E depois fizeram então ali uma ermida qu'inda lá está, qu'é a igreja do Monte. Fizeram antão a grande ermida em menos de seis meses. Toda a gente a trabalhar, homens e mulheres. E ficaram todos muito admirados, porque a ermida é muito grande. E é em pedra canteria. E as pessoas todas diziam que se não fosse por um impulso divino qu'era impossível serem tão unidos e fazerem aquilo em seis meses, porque não havia meios pra isso. E ainda lá está a história de Duas Igrejas. Lá está a ermida e a história na parede, porque ficou sempr'aquilo por escrito.
[M.C.F. perguntou em que data foi feita a ermida. A informante respondeu que tinha um livro que devia explicar isso, e que o iria buscar dali a pouco. Mais tarde (2A596), a informante agregou o seguinte: --Olhe, ainda agora esqueci-me de contar de Duas Igrejas. De duas Igrejas, ainda o P.e Mourinho falou com pessoas que se lembravam de ver a giesta florida no altar mor, dentro da igreja, e a fonte, que agora também já se secou. Secou a giesta e secou a fonte.]
- Source
- FONTES, Manuel da Costa Portuguese Folktales in North America: Canada n/a, sem editora, s/d , p.7A150:92
- Year
- 1984
- Place of collection
- Duas Igrejas, MIRANDA DO DOURO, BRAGANÇA
- Collector
- Manuel da Costa Fontes (M)
- Informant
- Albertina Esteves (F), 53 y.o., born at Duas Igrejas (MIRANDA DO DOURO),