APL 1276 A Ribeira do Guilherme e a Ilha Encantada
Há muitos anos atrás, lá para as bandas do Nordeste, mesmo em frente à Ribeira do Guilherme, existia uma ilha admirável, fértil e rica, constantemente aquecida por um sol de Primavera e onde os ventos eram só suave brisa. Os seus habitantes viviam em palácios dourados e entre todos reinava uma constante ventura. Nesta ilha governava uma formosa princesa, que era o orgulho dos seus súbditos. A pele alvíssima, os cabelos de ouro, os olhos mais azuis que o mar e uma bondade natural faziam da princesa um ser admirável. Embora fosse requestada por grandes senhores e poderosos reis, a jovem rejeitava com humildade todos os pedidos de casamento.
Certo dia aportou à ilha uma embarcação com mensageiros de um riquíssimo monarca que, ao serem recebidos pela princesa, logo declararam a sua missão: pedir-lhe a mão para o seu amo e senhor. Engendraram belos discursos, fizeram promessas maravilhosas, rogaram por fim, mas não conseguiram demover a princesa do propósito de se manter solteira.
Desiludidos, voltaram para a sua distante terra e, depois de uma longa viagem, apresentaram-se perante o rei, que os esperava ansioso, mas seguro de que em breve casaria com a desejada princesa. Quando ouviu pela boca dos emissários a resposta negativa e humilhante, ficou aturdido e furioso.
Sabendo que na última província do seu reino vivia uma fada de fatídicos poderes, mandou-a chamar imediatamente e transmitiu-lhe o seu desejo: queria que a ilha verdejante da princesa, com todos os monumentos, tesouros e habitantes fosse submergida.
A fada, tomando a vara de condão e pronunciando algumas palavras, fez imediatamente a ilha afundar-se no mar em frente à Ribeira do Guilherme, que assim ficou encantada para sempre.
Mas de sete em sete anos, na noite de S. João, a ilha aparece, toda branca, entre densas neblinas, pronta a ser desencantada por um sacerdote que vista as vestes sacrificatórias. Estas circunstâncias têm sido tão difíceis de reunir que a ilha continua encantada.
Uma vez, um navio carregado de trigo foi desviado por força misteriosa e, emergindo das águas um cavaleiro de elmo reluzente, exigiu que o capitão lhe cedesse todo o cereal por preço compensador. O trigo foi descarregado e o cavaleiro desapareceu, satisfeito porque o trigo iria abastecer a população da ilha encantada.
Nas noites de Inverno, quando o mar bravo fustiga os rochedos da costa e entra pela Ribeira do Guilherme, ainda se ouve a bela princesa queixar-se, desolada com o seu destino.
- Source
- FURTADO-BRUM, Ângela Açores: Lendas e outras histórias Ponta Delgada, Ribeiro & Caravana editores, 1999 , p.100
- Place of collection
- Nordeste, NORDESTE, ILHA DE SÃO MIGUEL (AÇORES)