APL 3361 Olival
No Estreito, aldeia d’esta freguezia, na extremidade por onde confina com a de Freixianda, tambem do concelho d’Ourem, está a capella, denominada de Nossa Senhora do Testinho, à qual anda ligada uma tradição popular, que tem todos os vizos de ser um facto historico; é o seguinte:
O conde de Castello Menor, D. Luis de Souza e Vasconcellos, ascendente dos marquezes do mesmo titulo, sendo perseguido pelos fidalgos da côrte de D. Pedro II (que fôra acclamado rei, em 1 do setembro de 1683, no proprio dia em que fallecera, preso nos paços reaes de Cintra, seu infeliz irmão, D. Affonso VI) sendo perseguido, digo, logo n’esse mesmo anno, por ser amigo e valido do monarcha fallecido, fugiu de Lisboa e veiu asylar-se n’esta aldeia do Estreito (que é cercada por uma vasta charneca) e que ahi, disfarçado em trajos de lavrador, passára alguns meses, vivendo na casa de uma pobre familia, empregando-se nos serviços rudes do campo.
Julgava-se o conde assim a coberto da vindicta dos seus inimigos; porem, acontecendo passar por aqui tres cavalleiros vindos de Lisboa (talvez de proposito a procural-o) em occasião que o conde seguia um lavrador que conduzia uma carrada de matto; e vendo que os cavalleiros reparavam muito n’ele, se foi, disfarçadamente esconder em um valle, por onde corre uma fonte.
Os cavalleiros instaram com o lavrador, para que lhes dissesse se aquelle era com effeito o conde, e lhes indicasse o sitio para onde dia havia hido, ao que o lavrador respondeu, que: nem aquelle era conde, mas um lavrador do logar, nem sabia para onde tinha hido – e, fazendo caminho para o sitio onde sabia que o conde estava escondido, descarregou sobre elle toda a carrada de matto; frustrando assim as pesquisas dos cortezãos, que desesperançados de acharem o conde, se foram por onde tinham vindo.
O conde, sahindo então do seu esconderijo, declarou que tinha escapado, por milagre de Nossa Senhora do Testinho, de cuja imagem andava sempre acompanhado; e logo alli fez voto de lhe erigir linda capella, n’aquelle mesmo sitio, e de a dotar com os meios necessarios, para n’dia se dizer missa nos domingos e dias sanctificados.
O conde cumpriu a promessa, erigindo a capella, e seu descendentes teem cumprido religiosamente a promessa do seu ascendente, cuidando na sua fabrica, e culto divino, e ainda actualmente alli se dizem missas nos dias d’ella.
José Dias Antunes, bisneto do lavrador que encobriu o conde, é que administra os rendimentos da capella, e cuida da sua fabrica e culto.
Para corroborar esta tradição, está á entrada da capella a seguinte inscripção:
AQUI ESTEVE
LUIZ DE SOUSA E VASCONCELLOS,
CONDE DE CASTELLO MELHOR, POR MUITAS
SEMANAS; O QUAL, INVOCANDO
O SANTISSIMO NOME DE
NOSSA SENHORA DO TESTINHO,
TEVE SUA DEFESA.
1683
Consta que existe no cartorio da familia Castello Melhor, um documento que prova a tradição.
- Source
- PINHO LEAL, Augusto Soares d'Azevedo Barbosa de Portugal Antigo e Moderno Lisbon, Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 2006 [1873] , p.Tomo VI, pp. 252-253
- Place of collection
- Olival, OURÉM, SANTARÉM