APL 3486 Nossa Senhora de Balsemão
Chacim é uma povoação muito antiga, que está situada a pouco mais ou menos doze quilómetros de Macedo de Cavaleiros. Várias lendas — uma das quais a que vou relatar — tentam explicar a origem da povoação e o seu nome. Contudo, chacim, em português antigo, significava simplesmente porco, suíno.
A cerca de três quilómetros da povoação, num alto, deserto e agreste, o monte do Carrascal, existe uma ermida dedicada a Nossa Senhora de Balsemão. Segundo a tradição, no local da ermida existia no tempo dos Mouros uma mesquita, assim como no local onde tempos mais tarde foi construído o Convento de Balsemão havia o castelo de um rei mouro.
A nossa história tem a ver com o senhor do castelo do monte do Carrascal, e passa-se no século IX ou X.
O rei mouro, diz a lenda, oprimia de várias maneiras a população cristã daquela região. E, mais uma vez, a ofensa maior que fazia às gentes consistia no velho costume de possuir as donzelas no primeiro dia dos seus casamentos.
Como sempre, os homens sentiam-se profundamente agastados e defraudados com aquela prática tirânica, e a resposta não se fez esperar. Um jovem da vizinha Alfândega, ao chegar a sua vez de noivar, «não esteve pelos autos» e, proclamando a sua revolta aos conterrâneos, conseguiu reunir um grupo de homens que com ele lutassem contra o opressor.
O mouro, ao saber da conspiração que se preparava, foi esperar os rebeldes nos campos de Chacim. O combate foi terrível, especialmente para os cristãos, que eram muito poucos, e depressa começaram a perder terreno.
De súbito, uma luz desceu sobre o campo de batalha e, no meio dos cristãos, feridos e desanimados, apareceu Nossa Senhora com um vaso de bálsamo nas mãos. Os combatentes, um a um, viram mitigadas as dores das suas feridas pelo bálsamo que a Senhora espalhava sobre elas, ao mesmo tempo que os alentava, dizendo:
— Cara aos mouros, cara aos mouros, meus filhos!
Cheios de uma nova esperança e ânimo, os homens de Alfândega avançaram contra os mouros com redobrada fúria. Num instante, conseguiram vencer a batalha, que tinham considerado perdida. O rei mouro foi morto e, com ele, quase todos os seus guerreiros. Em seguida, os cristãos dirigiram-se ao castelo, que, depois de saquearem, incendiaram e arrasaram.
Diz então a lenda que, em memória deste feito e em acção de graças a Nossa Senhora, foi mandada construir uma ermida no sítio da mesquita dos Mouros e que lhe foi dada a invocação de Nossa Senhora do Bálsamo na Mão, nome que com o tempo o povo foi simplificando para Balsemão. Essa ermida é hoje uma capela especialmente concorrida nos Domingos de Pascoela. O nome dessa romaria recorda ainda hoje o grito de alento da Virgem no campo de batalha de Chacim: Festa de Cara Mouro.
Para rematar, a lenda explica, ainda, que, como prémio da vitória alcançada pelas gentes de Alfândega, se acrescentou à localidade a designação da Fé, Alfândega da Fé.
Quanto a Chacim — que sabemos significar porco —, a lenda diz que tomou o nome da enorme chacina que se deu naquele dia.
- Source
- FRAZÃO, Fernanda Passinhos de Nossa Senhora - Lendário Mariano Lisbon, Apenas Livros, 2006 , p.34-35
- Place of collection
- Chacim, MACEDO DE CAVALEIROS, BRAGANÇA