APL 2373 O Pão onde aparecia sangue

O filho deles morreu e enterrou-se. Aa cabo de uns poucos de meses de ele ter morrido, a mãe  era do campo, a mãe amassava todas as semanas e quando acabava de amassar iam partir o pão para comer e todos os pães que partiam, no meio do pão estava uma manchinha de sangue. A mulher dava-lhe que fazer, dizia assim, mas se eu não tenho cortes nas mãos, nem nada, mas porque é que  o meu pão tem sangue.
Vinham as vizinhas do lado que a gente na praia também fazia isso, para termos pão mole pedíamos umas ás outras quando amassávamos, emprestavam para não terem sempre pão duro. Diz que iam as pessoas de família e olhe: - empreste-me lá um pão que eu amanhã amasso e depois logo lhe dou quente. A mulher dava o pão, quando partiam o meio do pão havia sempre uma mancha de sangue, o pão ensopado com uma mancha de sangue. Mas aquilo diz, levou anos a mulher a acontecer-lhe aquilo, mas que diabo é isto, que mistério é este. Que mistério é este, que mistério é este que a Maria dos Anjos casou e ela é muito amiga dessas e começaram déu em déu e déu em déu, e as vizinhas já umas com as outras, mas o pão da vizinha Amélia tem sempre sangue, mas aquela mulher o que é que ela faz ao pão, mas ela deita sangue no pão e a perguntarem-lhe. E a mulher diz pois eu amasso o pão como vocês amassam. De resto foi um dia a Maria dos Anjos e disse assim: - Oh tia hoje sou eu que lhe amasso o pão! Vamos lá ver se é nas suas mãos se o que é, isto é um mistério, mas que diabo é isto? A mulher ia comia o pão mas quando chegava àquele lugar tirava aquele bocadinho, guardava, metia numa gaveta, o resto do pão comia. Hoje amasso eu o pão, foi amassar o pão a Maria dos Anjos a mulher não tinha nada nas mãos, foram cortar o pão, cortaram o pão ao meio, lá estava a mancha de sangue outra vez. Diz a Maria dos Anjos assim: - (era uma irmã do pai da Maria dos Anjos), isto não é boa coisa, deixe estar que eu vou a Beja. Em Beja tinha lá uma mulher que sabia dessas coisas e foi a Beja e foi ter a casa dessa pessoa. Essa senhora de Beja disse-lhe: A sua tia enquanto não fizer o que eu lhe vou dizer, seja pão de quem for que ela dê, seja quem for amassar pão para ela, ela vai encontra sempre essa mancha de sangue. Portanto ela tem que fazer o que eu lhe digo: - Juntar esses bocados de pão. Mas a mulher não deitava fora esses bocadinhos de pão que encontrava com sangue porque aquilo dizia-lhe qualquer coisa e ela guardava aquilo, não deitava fora nem dava a ninguém, comia o pão bom e o resto tirava para fora. Ela que vá junte esses bocadinhos de pão todos que tem, disse-lhe a senhora onde foram tratar disso, junte esses bocadinhos de pão todos quantos tem e vá deitá-los á ribeira, tá lá o lugar da ribeira que tem que deitar, que ela se fizer isto que eu lhe estou dizendo, deixa de ver sangue no pão. E a Maria dos Anjos disse-lhe assim: - Então e por qual é o motivo que a minha tia tem que fazer isso e porque é que isso aparece no pão e é só no pão dela. E a pessoa disse-lhe: - Sabe o que é, é o filho que morreu na guerra com o tiro e era o buraco do tiro que era só o buraco onde é que tinha sangue e o filho não vai para o lugar dele enquanto a mãe não fizer isso, anda cá neste mundo penando. O filho morreu com muito desgosto que era um rapaz novo. Então elas fizeram-lhe aquilo que a mulher lhes ensinou o que havia de fazer, deitar na ribeira e se não tinham uma peça de roupa dele, que juntassem uma peça de roupa e a mãe disse por acaso eu dei tudo quando ele morreu mas deixei ficar uma bota esquecida e como aquela bota ficou esquecida eu depois já não dei fim dela e tenho a bota em casa, metam o pão todo mas metam o pão todo dentro da bota e vaiam enterrar na ribeira lá no lugar onde ele ia para ele ter salvação e ela deixar de ter sangue no pão. A Maria dos Anjos veio com a tia e mandou a tia fazer aquele trabalho e foram deitar. Na outra semana sangue á mesma no pão, a Maria dos Anjos telefona para a outra de Beja e diz-lhe: - Então? Então como é que é? Então se a minha tia fez o que você mandou e vê-se sangue no pão á mesma . A sua tia não pôs o pão todo, ela que procure mais gavetas que ainda há-de encontrar mais pão, enquanto ela tiver um bocadinho desse pão em casa, o filho não vai para o lugar dele e não deixa de aparecer. A Maria dos Anjos deu volta e encontrou mais três bocadinhos de pão, foram pôr o pão junto ao outro no lugar e diz que até hoje nunca mais a mulher, começou a amassar e nunca mais viram pão com uma pinga de sangue.
Era muito agarrado à mãe e para a mãe ver que o sangue, para ver que o sangue que estava no pão era o sangue que ele tinha derramado pela bala que lhe tinham atirado.

Source
AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) Faro, n/a,
Year
2007
Place of collection
Tavira (Santiago), TAVIRA, FARO
Collector
Rui Venâncio (M)
Informant
Maria João (F), 78 y.o., born at Tavira (Santiago) (TAVIRA),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography