APL 1003 Malefício na encruzilhada
Aí pelo dia 23 de Dezembro, devia ser meia-noite, eu ia daqui do Salgueiral, para Jogueiros. Para encurtar o caminho, meti por um atalho. Chego acolá acima, numa encruzilhada a que chamam Salgueiro, e encaro com um homem que vinha para baixo e que cortou para a direita.
Segui a minha rotina do caminho. Cheguei à encruzilhada mais acima e voltei a encontrar o homem que seguiu para a esquerda. Eu sigo na mesma a minha rotina por aí acima. Tinha tanto medo como tenho agora aqui. Cheguei à encruzilhada do Senhor da Salvação e estava outro homem ali de pé. Dei-lhe boas-noites, mas não respondeu.
Adiante, no lugar do Soito, donde tiravam o barro, ouvi duas pedradas atrás de mim. Caíram todas ao lado e não me fizeram mal nenhum. Eu era novo e, como andava sempre de noite, trazia um canhoto no bolso. Tiro-o e disparo para trás: tau, tau, tau, até ele encravar e não sair mais um único tiro.
Corri para casa e, quando cheguei, tinha uma dor de cabeça maior que o meu corpo. No outro dia, não pude ir trabalhar por causa da cabeça. Os meus beiços estavam cheios de arejos. Durante aquele dia, não me levantei. Só no dia seguinte. Digo assim para mim:
− Nunca o revólver me negou fogo e porque é que mo negou anteontem?
E não é que eu estava a experimentar o revólver em frente da janela e ele disparou? As balas por pouco não atingiram a minha irmã na barriga. Parecia que era o diabo que estava outra vez comigo. Andei incomodado, mesmo doente, com os beiços arrebentados, durante quinze dias.
- Source
- AA. VV., - Literatura Portuguesa de Tradição Oral s/l, Projecto Vercial - Univ. Trás -os-Montes e Alto Douro, 2003 , p.HD3
- Year
- 2002
- Place of collection
- Peso Da Régua, PESO DA RÉGUA, VILA REAL
- Collector
- Andreia Catilina Cardoso Monteiro (F)
- Informant
- Armando Monteiro (M), 80 y.o., Peso Da Régua (PESO DA RÉGUA),