APL 160 Caeira da malaca

«Vou contar uma história muito triste.
 Era no tempo em que os pais eram muito maus, faziam os casamentos às filhas e os namorados eram escolhidos à vontade dos pais, senão eram mortas ou queimadas.»
 Havia uma caeira que lhe chamavam a «Caeira da Malaca» que é além, quase ao pé do Escoural e andavam em famílias “cá daí 200 anos, uma coisa assim” onde coziam a cal. A pedra era amanhada, ficando uma abobadilha com a pedra, que era tapada com lama. Metiam lenha pela porta, dentro da abobadilha, onde era cozida, não sei se com oito dias ou mais, derretendo assim, ficava pronta para caiar.
 Andava lá umas pessoas a cozerem a cal, quando apareceu um senhor numa charrete. Procurou quanto é que valia aquela caeira de pedra. Disseram que era valor para 30 réis (era no tempo dos reis) e então o homem deu-lhes os 30 réis e disse para eles abalarem e que não quisessem saber mais da caeira, que ficava por conta deles.
 Curiosos para saber o que acontecia, pois sabiam que queimavam muitas pessoas, faziam muita desgraça, esconderam-se de noite e foram para cima de umas árvores e lá esperaram. De noite sentiram um barulho de um churrião “tru. ..tru. .,tru...”. Vinham com uma rapariga de “capuço” enfiado na cabeça e atado pela cintura.
Então aventaram uma saca “parecia que levavam qualquer bicho lá dentro e havia quem dissesse que eram cães, como a minha sogra dizia!”
 Aventaram o saco com esses bichitos lá dentro, mas como é um bocadinho apertada a porta do forno, não se queimaram com o calor que vinha lá dentro, mas tiveram também de penar, para serem capazes de a enfiarem lá. Conseguiram e ela coitadinha trazia umas chinelinhas de verniz pretas e com aquele estrebucho, caiu uma chinelinha no chão. Eles nem viram, ou não quiseram saber!
Conforme a aventaram lá para dentro, ela coitadinha, deu um grande estralo, rebentou o corpo com o calor.
 Eles fugiram e foram-se embora no churrião.
 As pessoas desceram das azinhagas e viram uma chinelinha no chão, de verniz com um “botaninho” de lado, onde abotoava.
 Ela coitadinha morreu queimada e nunca souberam donde ela era ou donde ela não era.
 “Contam por verdade, mas não posso afiançar, a minha sogra contava por verdade que até tinha visto a chinelinha!”
 Mais tarde as pessoas tentaram fazer mais cal, mas não conseguiram, pois ouviam gemidos, tiveram pena e deixaram de lá fazer.

Source
AA. VV., - Lendas e Tradições Evora, EBM's de Guadalupe, S. Sebastião da Giesteira e Valverde, 1999 , p.11-12
Place of collection
São Sebastião Da Giesteira, ÉVORA, ÉVORA
Informant
Mariana Gertrudes Contador (F), 71 y.o., São Sebastião Da Giesteira (ÉVORA),
Narrative
When
20 Century, 90s
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography