APL 1646 [Aparição]
O João da Telhada tem visto o Marques Lobo, mas como lhe não mostrou medo, o Lobo não se meteu nele. Meteu-se porém numa rapariga de Santa Leocádia, que falando por ele, declarava que nem estava no Céu, nem no Inferno, que andava por aqui, porque se pagava depois de morto o que se tinha feito em vida e no mesmo lugar do delito. Dava mesmo a entender que não havia Céu, nem Inferno. Se batiam na rapariga, gritava o espírito que o corpo não tinha culpa nenhuma, mas que de resto podiam bater à vontade, porque nada lhe daria. A rapariga (i.e. o espírito do Lobo) bramava contra o João, de quem fora inimigo. Anunciou que não tardava a aparecer um espírito bom (uma “borboleta branca” que apareceu numa ocasião em que se juntaram em casa). A borboleta tem uma história. Quando o João (é ele que conta a coisa) ainda era solteiro, ia todas as noites a casa da futura mulher e começou a embirrar com uma borboleta branca que se lhe pousava no chapéu e não saía dali. Uma vez disse diante da amante que ia matar a borboleta, mas esta intercedeu por ela. É ainda a mesma borboleta que aparece na cena da endemoninhada, que acaba por declarar que a borboleta é “a alma da mãe do João”.
Mas esta versão não combina bem com a seguinte: — a mulher do João, em solteira apegou-se com a alma da mãe dele para tocar o filho e movê-lo a desposá-la, pedindo ao mesmo tempo para lhe dar um sinal de que a ouvira. Foi desde então que a borboleta branca começou a aparecer no chapéu do futuro marido. Quando mais tarde a endemoninhada anunciou que não tardaria a entrar um espírito bom e entrou a borboleta, que pousou num barrote, o João quis matá-la e a mulher opôs-se dizendo que sabia o que aquilo era, sendo então que veio à baila e à notícia do João a identidade entre a borboleta branca e a Mãe.
- Source
- SARMENTO, Francisco Martins Antígua, Tradições e Contos Populares Guimaraes, Sociedade Martins Sarmento, 1998 , p.140-141
- Place of collection
- GUIMARÃES, BRAGA