APL 2411 A Figueira dos olhos negros

Informante: Conheço! Conheço uma, que se contava aqui em Quarteira, precisamente não sei dizer o ano, mas tinha dezoito… doze anos, tenho trinta e oito anos… Tinha doze anos, andava na escola e morávamos numa rua chamada o Triângulo. A rua do Triângulo, que ainda hoje em dia existe. Mas está completamente diferente, já está tudo construído. E existia por ali uma casa velha, uma casa… na altura era nova, agora… depois foi envelhecendo, os donos morreram, depois foi tudo envelhecendo, mas existiam umas figueiras. Precisamente existia uma figueira mesmo ao lado da casa enorme, enorme! Enorme, e com uma estrada batida, de terra e aquilo não tinha luzes, era completamente escuro. Não tinha nem lampiões nem nada naquele tempo, e eram assim, morros com pitas, aquelas pitas, cactos, cheio de picos. E quando agente vinha da escola, as seis horas da tarde, de Inverno já era escuro… Ai… passávamos por ali de olhos fechados porque existia essa casa, com as cortinas e só se ouvia, só se via as pessoas a puxar as cortinas, mas agente nunca via a cara das pessoas, e diziam que foi ali uma moça assassinada! Que os pais prendiam-lhe naquela casa e ela morreu lá naquela casa e então…
Colector: E costumava ouvir muito essa história?
Informante: Contava-se. Já se contava essa história e diziam que era a menina dos olhos negros, que aparecia na figueira. E diziam que depois da meia-noite, quem passasse por ali, via os olhos negros, da miúda no meio das figueiras.
Colector: E quando passava por lá. O que é que sentia?
Informante: Arrepios e medo!
Colector: Nunca abria os olhos?
Informante: Eu não! [entre risos] Fugia a sete pés! Evitava! Evitava de passar por lá!
Colector: Na altura havia muitas pessoas que comentavam essa história?
Informante: Havia! Os velhos todos. As pessoas… os jovens, nós todos quando vínhamos da escola, agente acreditava nessa história porque os velhos nos contavam! E realmente aquela casa era bizarra! Agente passava assim…
Colector: E hoje em dia a casa ainda existe?
Informante: Não! É onde existe… onde está o “Cadilac”! Onde é o bar o “Cadilac”. Era mesmo ali a figueira.
Colector: E hoje em dia as pessoas costumam contar essa história?
Informante: Não. Porque as pessoas esqueceram-se. Aquilo foi mudando, foram reformando aquilo e hoje existe por lá um bar. Realmente o bar é muito esquisito, passam-se sempre lá coisas muito esquisitas naquele bar: o dono é maluco, é um bar que só param prostitutas, bêbados e coisas assim muito esquisitas!
Colector: Mas a primeira vez que ouviu essa história então foi quando tinha doze anos?
Informante: Exactamente. Aquilo só começaram a construir… aquela zona começou a se construída, depois de eu ter já… mais de vinte anos. Já os meus filhos eram nascidos.

Source
AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) Faro, n/a,
Year
2008
Place of collection
Quarteira, LOULÉ, FARO
Collector
Marlon Miguel Monteiro (M)
Informant
Armanda Rodrigues Monteiro (F), 38 y.o.,
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography