APL 2236 [As pontes de Amarante e da Aliviada]

Um dia São Gonçalo encontrou o Diabo e disse-lhe que ia fazer uma ponte em Amarante, e o Diabo por sua parte disse-lhe que ia fazer uma na Aliviada, no concelho do Marco. Cada um fez a sua, ao despique.
 O Diabo foi primeiro e viu a de Amarante e ficou com inveja, porque a achou muito boa, e convidou o santo para ir ver a dele, que tinha construído de maneira que São Gonçalo caísse. Pediu-lhe que não levasse bengala com medo de que ele, fazendo uma cruz no ar com a bengala, a benzesse. O santo de princípio recusou-se, mas depois foi e andou a vê-la toda e conheceu logo a mazela que o Diabo lhe deixara, para o matar e ao povo, a quem queria levar para o Inferno. E o santo disse:
 — Acolá estão umas pedras erradas.
 E o Diabo:
 — Então, elas que erro têm?
 E São Gonçalo diz, fazendo com o dedo uma cruz:
 — Se aquela pedra estivesse aqui, e esta ali, ficava bem.
 E logo a ponte se esbarralhou. O Diabo fugiu para dos montes vizinhos a atirar-lhe com grandes penedos, e logo cada um chegava perto do santo, este dizia.
 — Vai para ali — e ficava assente.
 E por baixo deles e também da ponte desmoronada é passa o rio.
 Depois o santo foi-se embora e o Diabo ficou ali na Aliviada, feito carniceiro a vender carne. Não pegava no dinheiro (por ter cruzes), mas mandava-o pôr em cima duma pedra, e a carne tornava-se logo excremento de burro. Isto para pregar peças ao povo.
 Os antigos diziam que ali, na ponte da Aliviada, era a boca do Inferno e que debaixo daquela concavidade se tinham tirado pessoas vivas, que haviam desaparecido por força das pragas com que outras pessoas as davam ao Demónio. Só depois que no dito sítio se colocou uma cruz de pedra se afugentaram as coisas sinistras que ali sucediam e os fantasmas que apareciam. O sítio é espantoso e horrendo.