APL 2547 [O Menino dos Olhos Grandes]

Antigamente, contam os velhotes que chegavam pescadores a casa assustados, assustados, mas muito assustados mesmo, “qu’era”: - Porque é que “tás” tão assustado?
- Àh, fui “pó” mar e apareceu-me um menino “d’olhos” grandes!
-Um menino “d’olhos” grandes?
E toda a gente da família ficava assustada!
E “com’é” “qu’isso” “éi”?
E depois contou a história conforme todos contavam e era assim: - Eles iam “pó” mar, na altura “nã” havia luz, “nã” havia nada, em Olhão era o sítio que se “nã” fosse pela luz das estrelas ou pela luz lua, se houvesse lua, e aqueles dias mais escuros ouvi um bebé chorar, o bebé chorava, chorava e eles: - Um bebé aqui a chorar? Nunca vi!
Iam ver quem era, um bebé mesmo, um bebé a chorar!
Agarravam no bebé e diziam: - Abandonaram aqui um bebé, uma criança! A criança ao colo e agora onde é que eu vou levar a criança! Ah, vou levar “pó” barco, pode ser que alguém tenha deixado aqui o bebé!
Pegou ao colo, iam andando, o bebé ia pesando, ia pesando e depois punham o bebé ás costas, “n’éi”!? cada vez “tá” “má” pesado, punham às costas normalmente, ou punham assim “d’uma” forma mais cómoda, quando bebé ia chorando, ia pesando e eles começavam a olhar assim p’ró bebé e o bebé olhava para eles assim com uns olhos “muita” grandes. E depois diziam assim: - É “pá”, mas tu pesas assim tanto porquê?
O bebé chorava, chorava e, ao chegar quase lá ao barco ia-se transformando, ia crescendo, ia crescendo e jogava as mãos aos pescoços dos pescadores, “memo” naquele de, se calhar era mágoa, se calhar ruim, sabe-se lá! E eles ao sentirem-se afogados com o bebé, jogavam o bebé “p’ó” chão “n’era”! E depois claro, assustados iam “p’a” casa. E era essa história do menino “d’olhos” grandes que acontecia e, nunca ninguém soube até hoje quem era este bebé que fazia isso, porque nunca ninguém conseguiu trazer o bebé, porque ia pesando, pesando, pesando, no fim jogava-lhes a mão ao pescoço, “memo” na tentativa de os matar.

Colector: Acha que era por medo de chegar ao pé do mar que o bebé ia crescendo?
Informante: não, aquilo era uma, segundo eles diziam, aquilo era uma alma “d’outro” mundo, um ente mau, que existia aí e fazia mal aos pescadores, queria matá-los, talvez porque morreu afogado, aí “n’algum” sítio, n’algum barco, ou que veio cá depois, sei lá vingar-se de algum pescador que o matou ou algo parecido e, qualquer pescador que fosse para o mar, ele fazia isso.

Source
AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) Faro, n/a,
Year
2007
Place of collection
Olhão, OLHÃO, FARO
Collector
Carla Ramires (F)
Informant
Sr. Augusto (M), Olhão (OLHÃO),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography