APL 3477 Nossa Senhora dos Milagres, da Serreta, Açores

Nos finais do século XVI, havia na ilha Terceira um piedoso sacerdote, já velhinho, que desejava fugir do mundo e dos homens, por ter sido vítima duma perseguição injusta.
    Um dia, tomou o seu bordão e uma imagem da Senhora dos Milagres e pôs-se a caminho. Correu montes e serras, embrenhou-se pelos matos, até não ouvir senão o barulho do vento nas árvores. Enquanto seguia viagem, teve uma visão doce de Nossa Senhora, que o fortaleceu e lhe indicou o lugar de paz onde ia viver.
    Por fim, chegou a um sítio de terra áspera, junto a uma zona rochosa, com uma serra pelo Norte, que provocava muitos nevoeiros e onde não havia vivalma.
    Com muito sofrimento e trabalho construiu sozinho no lugar da Canada das Vinhas, na queimada, uma modesta e pequena ermida, que lhe serviu de abrigo e onde pôs a imagem de Nossa Senhora dos Milagres, que o tinha acompanhado sempre. Sentiu-se enfim feliz, orando aos pés da Virgem. Não tinha o que comer, porque havia pouca caça e os terrenos eram selvagens. Passou fome, mas, milagrosamente, os milhafres ou queimados começaram a trazer-lhe comida com que se alimentou durante anos. Ali viveu o resto dos seus dias, entregue à oração, longe do barulho das povoações e da maldade dos homens, na paz da sua consciência e no silêncio do ermo.
    Passados anos, depois de o padre morrer, a ermida, abandonada, ficou em ruínas. Outra se ergueu, em lugar diferente, e o povo passou a acorrer àquele lugar, em romagem, em grande quantidade, praticando actos poucos dignificantes. Tiveram de transferir a imagem da Senhora dos Milagres para a paróquia das Doze Ribeiras.
    A Senhora operou vários milagres, e a irmandade dos «Escravos da Senhora» prometeu reedificar a ermida da Serreta, que entretanto se tinha degradado. Ainda hoje a festa da Senhora dos Milagres, da Serreta, se realiza, e a imagem levada pelo padre ainda lá está.