APL 922 A senhora da candeia

O caso passou-se entre a aldeia de S. Lourenço e a de Paredes, ambas pertencentes ao Concelho de Sabrosa.
 Numa noite de breu, um pobre almocreve regressava à sua aldeia de Paredes, depois de ter percorrido as aldeias vizinhas, a vender azeite, petróleo, fósforos e sabão. Ao caminhar, tropeçou numa pedra solta da íngreme vereda e deixou escapar as rédeas ao macho que, espantado com o rolar do calhau, desatou a correr, à rédea solta, e desapareceu na escuridão da noite. Muito triste, a dizer mal da sua vida, o bom do homem caminhou algum tempo sem destino, até que, vendo-se perdido, exclamou em voz alta:
 - Valha-me a Virgem Maria!
 Palavras não eram ditas, lobrigou uma humilde cabana, onde luzia a claridade ténue duma candeia de azeite. Surpreendido com a aparição daquele tugúrio que nunca vira, embora conhecesse toda a serra como a palma das mãos, bateu à porta levemente, com um misto de temor e de esperança. A porta escancarou-se imediatamente e uma senhora, jovem de aspecto, vestida de branco, com um sorriso acolhedor, mandou-o entrar. E, depois de ouvir atentamente a triste narrativa do amofinado visitante, levantou-se, pegou na candeia de azeite e disse:
 - Venha daí comigo, vamos os dois procurar a alimária.
 E, sem mais palavras, começou a caminhar à frente do almocreve. As suas passadas eram firmes e seguras, sem qualquer espécie de hesitação, sinal de que conhecia bem o terreno que pisava. Ao cabo de pouco tempo, foram dar a um lameiro, onde o faminto animal tosava sofregamente as folhas tenras de milho meão. A senhora estendeu o indicador da mão esquerda e disse:
 - Aí tem o seu macho. Vá buscá-lo.
 O almocreve, quase incrédulo como S. Tomé, correu para o seu amigo de jornada, que se deixou apanhar como manso cordeirinho. Cheio de contentamento, voltou-se para a senhora para lhe agradecer, mas já não a viu: desaparecera, misteriosamente, com a sua candeia de azeite.
 No dia seguinte, contou na aldeia o que lhe acontecera e todos, maravilhados, atónitos, confirmaram que, naquele lugar, não havia casa nenhuma. Mas, pelo sim, pelo não, bateram a serra de lês a lés, e de casa nem rasto! Então só podia ser Nossa Senhora que o almocreve invocou no momento de aflição e que, com a sua bondade maternal, foi em seu auxílio, com a candeia de azeite.
 Por essa razão, chamaram-Lhe a Senhora da Candeia. E, para Lhe agradecer tão grande milagre, os moradores de Paredes construíram uma capelinha em sua honra e fazem-Lhe uma festa todos os anos, no dia 2 de Fevereiro, na qual costumam comer as saborosas papas de milho. E ao lugar onde o almocreve encontrou a Senhora deram o nome de Fraga da Senhora da Candeia.

Source
FERREIRA, Joaquim Alves Lendas e Contos Infantis Vila Real, Edição do Autor, 1999 , p.87-88
Place of collection
SABROSA, VILA REAL
Narrative
When
20 Century, 90s
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography