APL 1921 [O lobisomem]

Antigamente falava-se muito em bruxas e em lobisomens.
E uma altura qualquer um rapaz, havia um homem que se fazia... Pronto,  chegando a noite, ele saía de casa e ficava feito em lobisomem, (eu não sei explicar o que é isso, mas falava-se. Se tudo o que se fala há, não sei se há ou se houve, agora nem se ouve falar nessas coisas).
Mas ele tinha um filho já grande, que tinha lá ido para as namoradas, ou dar algum passeio não sei aonde. E naquele tempo andava todo o mundo a pé, já se sabe, de um lado para outro, fosse o caminho curto ou comprido, era à pata para todo o lado .
De maneira que, numa altura qualquer vinha de uma festa ou de um baile,ou de um lado qualquer, aquele rapaz sozinho. E chega a um sítio encontra um burro. Disse:
- Ó pá, ainda me falta um bocado para chegar a casa. Deixa-me cá ver se tu me vais levar, se me fica o caminho mais leve.
E vai, deita a mão no burro. O burro não se espantou. Ele pôs-se a cavalo no burro.
- Arre burro que aqui te sirvo.
E o burro leva-o até a casa.
Chegou a casa, ou lá ao pé, antes de entrar no pátio ou para ali na proximidade, e desce do burro. Bate-lhe assim com a mão no cachaço e disse:
- Obrigada que já me tiraste um peso de cima, sempre lá ficou o caminho mais leve.
Naquilo, vai para entrar para casa e deixa de ver o burro imediatamente. Naquilo aparece-lhe o pai à frente. Disse:
- Então, você por aqui a esta hora?
- É verdade filho. E não estou assim muito satisfeito contigo.
- Então porquê pai?
- Porque eu  tive de te trazer desde tal parte para aqui. Tu [para] a outra vez quando me encontrares nessa situação, tu nunca mais utilizes para vires a cavalo no burro porque afinal agora estou bastante moído.
- Então, mas o pai não é um burro!
- Tu sabes que eu, se não sabes ficas a saber que eu ando nestas condições assim. E logo depois de sol posto, o  primeiro animal que eu vejo, depois que se ponha o sol, eu faço-me nesse animal até às tantas da  manhã.
E nesse dia calhou a ser um burro.
- E tu encontraste-me e vieste a cavalo em mim. E eu, trouxe-te até casa mas podes crer que estou  bastante moído. E vê se voltar a acontecer, se não voltas a fazer isso.
- Ó pai, desculpe que eu não sabia. Eu realmente nunca imaginava que o pai andava nessa situação, mas pronto eu não volto a fazer.
Desculpe lá e pronto.

Source
AZEVEDO, Ana A Literatura Oral na Comunidade Emigrante Portuguesa em Montreal , Universidade do Algarve, 2002 , p.# 40
Year
2001
Place of collection
PORTO DE MÓS, LEIRIA
Informant
Dionísia (F), 66 y.o., born at PORTO DE MÓS (LEIRIA),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography