APL 470 Lobisomens de alvor
No verão, aqui em Alvor, as mulheres vinham à noite p’rá rua fazer emprêta e atão uma vez (no outro dia era dia de mercado), enquanto elas estavem fazendo emprêta aparece um burrinho, um burro pequeno e dizem elas assim, ai, um burrinho, amanhã vamos vendê-lo ó mercado. Meterem o burro no quintal bem amarrado a uma figuêra à espera do outro dia p’ra irem vender o burro.
Atão, daqui a bocadinho, estavem elas a trabalhar na emprêta, na vêm vir o burro outra vez na rua?
Ganharem mêdo. O burro, como era lobisome, já na estava preso na figuêra e apareceu no mesmo lugar. Dizem elas assim olha, ai vem o burro outra vez.
Arrebanharem a emprêta p’ra dentro de casa, fecharem a porta muito bem fechada, apagarem a luz e depois começa o burro ós coices à porta, que era de meter pavor.
Atão e um, que ia matando a mulher? Uma noite ela foi fazer uma visita a uma vizinha e o marido era lobisome, mas ela na sabia. No caminho deu com ele, quando ele tinha chegado à altura de despir a roupa p’ra ir à vida de lobisome. A mulher vinha passando e ele estava com a raiva e jogou-se à mulher, iá matando. Ela tinha uma saia vermelha, ficou os fios da saia nos dentes dele.
Ela ficou tã mal que foi p’rá cama cheia de dores. E então ele foi dar umas sopas à mulher que tinha ficado na cama da grande tareia que ele tinha-lhe dado, ela olha p’rá boca dele e viu os fios da saia e disse ai, grande malandro que tu me matastes. E ele disse sim, mulher, fui eu e agora p’ra eu acabar a minha sina tens que tu ir buscar, ó pino da meia noite, a minha roupa de lobisome naquela estrumêra onde eu vou-me despir e dar-le fogo. Más fecha-te muito bem, em sorte que eu nã te possa alcançar, se eu t’alcanço, eu mato-te disse ele.
A pobrezinha da mulher foi buscar, ardeu aquelas roupas que eram assim umas peles como de um animal, p’rácabar com a sina dele, enquanto ele à porta, só ao soco e ao pontapé p’rábrir a porta, más já era muito de dia e ele estava mi cum’á mãe o deitou ó mundo, ali na rua. E depois da mulher ver que o sol já vinha muito alto é que abriu a porta. E foi assim que acabou com a sina dele.
- Source
- TENGARRINHA, Margarida Da Memória do Povo , Colibri, 1999 , p.41-42
- Place of collection
- Alvor, PORTIMÃO, FARO
- Informant
- Deonilde dos Santos Martins (F), born at Alvor (PORTIMÃO),