APL 2804 A razão das serpentes serem muito velhas
Sabem porque as serpentes são muito velhas e morrem com centenas de anos?...
Era uma ocasião um homem muito rico, muito rico, muito rico. Faz parte também da história, mas é uma história já muito antiga. E era muito rico mas já muito velho. Tinha a Velhice fechada num cofre de ouro. E só ele é que tinha a Velhice, porque tinha netos, bisnetos… Quer dizer, os outros morriam mas ele ficava sempre. Até que um dia qualquer, a Morte disse-lhe:
- Ó meu amigo, está a chegar a hora de te pores a andar!
- Tenho a Velhice…
- Não, não. Isso agora, tens de o dar ao teu mais novo.
Ele pega, então. Foi obrigado. E mandou: a Velhice tinha de ir num burro mas num burro que a levasse sozinha. Mas era muito longe. E como era muito longe, ele trazia um gajo a ensinar-lhe o caminho, que depois carregava-o e ele ia ter depois a casa do bisneto, traneto ou qualquer coisa.
Certo que é, ele mandou a Velhice e a Morte levou o velho. Mas antes de morrer, carregaram a carga, que era a Velhice, em cima do burro, porque o burro ficava ele… Os burros ficavam eles a ser muito velhos! Mas como é burro e tudo… Tinha de atravessar um rio. Mas o rio… a água era baixinha naquele lugar e atravessava bem. Só que, naquela altura, uma serpente que sabia o que ele levava – aquilo era muito longe, ele ia cheio de sede e queria beber. Ele passar podia passar, mas beber não podia porque a serpente metia-se-lhe na boca e matava-o. Até que ele disse:
- Olha, eu quero beber…
- Só bebes se me deres a carga, a carga que levas.
Ele, tão aflito com a sede, deu-lhe a carga e bebeu e foi-se embora. Lá foi ter à família do velho mas já sem nada. A serpente ficou com a carga, ficou com a Velhice.
E é por isso que hoje há serpentes com mais de duzentos, trezentos ou quatrocentos anos.
- Source
- AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) , n/a,
- Place of collection
- ALIJÓ, VILA REAL
- Collector
- António Fontinha (M)
- Informant
- José Joaquim Pereira Lourenço (M),