APL 2193 O tesouro dos maruxinhos

Contam os antigos que o Castelo do Mau Vizinho, situado na margem do rio Mouce, no concelho de Chaves, foi outrora habitado pelos mouros. E que, um dia, S. Tiago, montado num enorme cavalo branco, saltou sobre o castelo e destruiu-o, expulsando os seus moradores.
O Castelo do Mau Vizinho ficou, por isso, em ruínas (tal como hoje está). E também se diz que os mouros lá deixaram valiosos tesouros enterrados, sendo um deles um bezerro de ouro.
Muitos anos depois — vá lá saber-se porquê —, as ruínas do castelo passaram a ser habitadas pelos maruxinhos, uma tribo mágica de mafarricos miudinhos que viviam de noite e escondiam-se, o mais que podiam, durante o dia.
Diz a lenda que, sendo eles pequenos e franzinos, se viam gregos para desviar as pedras do Castelo do Mau Vizinho para lá poderem entrar e morar. E que, um dia, já cansados de tanto puxar, ao depararem com uma grande fraga que não conseguiam desviar, resolveram usar de um poder mágico infalível. Ora vejam:
Andava, numa certa tarde, um pastor de Lebução nas redondezas do castelo e ouviu, saída do interior dessa fraga, uma misteriosa voz que dizia:

— Quem me a mim quiser virai
grande fortuna há-de encontrar!

O pastor foi logo lá com o cajado, mas… é o viras[ Tentou uma, duas, três vezes… e nada. Desistiu. E, quando se aprontava para virar costas, logo a mesma voz insistiu:

— Quem me a mim quiser virar,
grande fortuna há-de encontrar!

Correu então o pastor à povoação e logo fez constar a grande fortuna que se anunciava no castelo do Mau Vizinho. E o povo não hesitou um instante. Conta-se que os de Lebução foram lá em peso, com ferros, guilhos, enxadas, picaretas... tudo o que tinham à mão. E, chegados ao castelo, logo da mesma fraga, aquela voz mágica soou, inconfundível, aos ouvidos de todos:

— Quem me a mim quiser virar,
grande fortuna há-de encontrar!

 

Mais ânimo ganharam, já se vê, ao ouvirem tal. Puxa tu daí, arrasto eu daqui... todos à uma, a suarem por quantos poros tinham, lá conseguiram finalmente virar a fraga. E nesse exacto momento, exclama, do seu interior, a mesma voz, triunfal:

— Bem haja quem me virou,
que há já muito que assim estou!

Ficaram desconsolados os de Lebução. E quanto aos maruxinhos, diz a lenda que assistiam de longe, escondidos nas fissuras das fragas, satisfeitos e divertidos.
E o tesouro? Afinal existia? Não existia? O povo acredita que pelo menos o tal bezerrinho de lá continua. Só que está encantado. E desencantá-lo não é tarefa para qualquer mortal.

Source
PARAFITA, Alexandre O Tesouro dos Maruxinhos: Mitos e Lendas para os Mais Novos , Oficina do Livro, 2008 , p.8-10
Year
2005
Place of collection
CHAVES, VILA REAL
Informant
Ana da Assunção (F),
Narrative
When
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography