APL 1771 [Os Mouros da Quinta de Marim]
Durante a permanência dos mouros e no local denominado de Quinta de Marim, segundo a lenda, ter ali existido um mouro bastante rico vivendo num castelo sito no meio da sua herdade. Tinha este mouro uma filha muito formosa pelo que a mesma era então constantemente pretendida pelos jovens ricos do seu tempo, vivendo nesta província. Todos estes ricos pretendentes tentavam, sempre que para isso tinham oportunidade, de conseguir do velho árabe a mão da sua formosa filha, mas este sempre desconfiado e teimoso inventava todos os pretextos para contrariar e fugir das propostas de casamento feitas a sua filha. Entre todos os interessados já citados havia um jovem muito rico e poderoso que não descansava nem desistia do seu intento. Este jovem mouro era além de rico, um profundo conhecedor do mundo da magia, bem como grande poeta e refinado músico.
Porém, o pai desta bela e gentil moura não via com bons olhos as intenções deste pretendente, quando durante a noite se apercebia da presença do mesmo junto à janela de sua filha, ouvindo-o cantar, situação que o levava a ficar desesperado e inquieto, enquanto que o mesmo no acontecia à sua bela filha, que pela noite fora se levantava de sua cama e abria a janela do seu quarto para ouvir e presenciar o seu amado, enquanto este ali permanecia.
Concluindo o velho mouro, finalmente, que nada conseguia para se opôr à união dos dois jovens, ordenou ele que chamassem o pretendente à sua presença.
O que me queres, perguntou o jovem na presença do velho?
Sei que amas a minha filha, por ela dou a minha vida.
Não quero de algum modo contrariar a vossa união, mas eu fiz um voto, diz o velho mouro.
Que voto? Respondeu o jovem.
Os meus campos estão secos e sem água. Só concederei a mão de minha filha, a quem numa noite transportar para junto do meu castelo a famosa nascente que todos conhecem por “Fonte do Canal”, sita a Levante.
Fica muito longe? Perguntou o jovem pretendente.
A treze léguas daqui, retorquiu o velho, Depois disto, o rapaz retirou-se respeitosamente sem nada dizer.
O velho mouro logo que o jovem se afastou, ficou extremamente contente e confiante, dizendo para consigo:
Deste já me livrei. Nessa noite o velho dormiu em absoluto descanso. Seria meia-noite quando ele acordou bastante sobressaltado, pelo que ao sentar-se na sua cama ficou atento a tudo o que à sua volta se passava. Pouco depois as notas de um alaúde atingiam os seus ouvidos, seguidas de alguns versos que louvavam a “ALLAH”.
Logo que o velho ouviu estes versos e reconheceu pelo timbre de voz tratar-se do pretendente de sua filha, levantou-se da cama repentinamente e correu para a janela do seu quarto. Verificou então que defronte janela do seu quarto e bastante surpreendido se localizava uma linda fonte donde provinha água em catadupa com caudal mais que suficiente para regar toda a propriedade. Simultaneamente, ao lado da fonte, viu o pretendente de sua filha segurando seu alaúde com os olhos fixos na janela do quarto da sua amada.
Completamente desvairado e não querendo voltar atrás com a sua palavra, dirigiu-se ao quarto de sua filha tendo-a encontrado à janela. Agarrando-a, atirou-a através da janela sobre o rapaz, o, qual, não conseguindo manter-se em equilíbrio acabou por cair como seu querido e inesperado fardo, no fundo do abismo donde provinha a fonte.
Diz o povo que não morreram e que costumam sair daquele abismo à meia-noite com os braços mutuamente cruzados passeando por aquela quinta ao som do seu alaúde.
Eles estão ali encantados não porque o velho mouro os encantasse, mas por intervenção do próprio ALLAH que não permitiu que estas duas almas cheias de amor e dedicação mútua desaparecessem da face da terra. Quanto ao velho mouro ele está também encantado mas no seu próprio castelo só daqui saindo em noites de tormenta e vendaval.
- Source
- AA. VV., - Tradição Popular Algarvia , Direcção Geral de Educação de Adultos, s/d , p.Lendas
- Place of collection
- Olhão, OLHÃO, FARO
- Informant
- Conceição Rodrigues Gomes (F), Olhão (OLHÃO),