APL 241 A lenda das amendoeiras
Existiu em terras do Algarve, no tempo do domínio muçulmano na Península Hispânica, uma moita encantadora e bela de nome Dinorah, filha de Aghar.
Nesse termo outra não havia tão formosa e de encantar. Seus olhos eram da cor do luar; seus cabelos ondulados, da cor do âmbar; seus lábios tinham o tom do carmim, a cor das rosas da Primavera e na sua voz melodiosa e doce havia a semelhança do trinar das aves.
Triste era o seu viver, e seus olhos — dir-se-ia — não terem sido feitos senão para chorar suas penas.
Seu coração afectuoso e apaixonado Dinorah não tinha a quem o dar. Numa tarde de Primavera, quando as amendoeiras estavam todas floridas, apareceu junto de si um trovador que se pôs a cantar deste jeito:
«Morena duns olhos pretos
«Tal a noite sem luar,
«Ó morena linda, dize
«Em que te posso ajudar?!...
E Dinorah em seu triste falar lhe respondeu:
«cavaleiro, já que podes,
«Dá-me um véu para noivar?!...
Ouvidas estas palavras, o gentil cavaleiro partiu, a galope, em seu fogoso ginete, Já distante corria, ainda pôde escutar:
«Eu hei-de para castigo,
«Juntos, os dois encantar...
«Não fala a gente cristã,
Dinorah, filha de Aghar…
Tais palavras não podiam ser proferidas senão por vozes celestes que se faziam escutar. Era uma divina sentença de Allah.
Alta hora da noite ouviu-se o trinar de um alaúde e a voz doce de alguém que o acompanhava.
Quando ao outro dia a moira acordou ao sol nascer, viu um braço do cavaleiro gentil a acenar do outro lado e tudo à sua volta eram pétalas brancas de noivar.
Quando ela ia para lhe agradecer, seu corpo de deusa da beleza se mudou em fonte, e o dele se transformou em lago. Desde então andam os dois a correr, juntos, para o mar. Porém, as flores de amendoeira não as pôde em nada mudar Allah, que todos os anos, mal chega Fevereiro, andam por aí a noivar.
- Source
- DELGADO, Manuel Joaquim A Etnografia e o Folclore no Baixo Alentejo , Assembleia Distrital de Beja, 1985 [1956] , p.226-227
- Place of collection
- BEJA, BEJA