APL 1878 [O Rapaz que Caiu na Cisterna]
Bom, e ainda vou contar a outra. O rapaz ainda está lá. E está gente de Ponta Delgada. Dessa freguesia. ‘Tão aqui em Stoughton. Vários. Até ‘tá um irmão desse qu’ê vou-le contar.
Havia lá um senhor - ele ‘tev’aqui muitos anos na América - tinha nã sei quantos filhos, e agora um dos filhos não era bem atraído. Era um rapazinho, um piqueno, mas não era bem atraído. Via a música tocar, ele ‘tava fazendo aqueles trêjeitos. Não era...
E quando um dia a mãe ‘tava lavando-os. Aquilo, já se sabe, naquele tempo não era como é hoje em dia, era na selha grande à na coisa, não era com quartos de banho nem... E ele vai, e a mãe ‘tava-os lavando, e quando o qu’era mais tolinho e falta. E eles começam a chomá por ele. E vão chomando e vão chomando. Tinha desaparecido. Tinha-se largado. E isto era na véspera d’Espírito Santo, d’andá c’o Senhô Espírito Santo. E quando eles saiem à rua pa chemar, ele vinha saindo do pé da cisterna, da cisterna qu’eles tinham, muito funda. Lá em baixo. Era c’a corda amarrada num balde pa puxar a água pra cima.
E quando o rapaz todo num pingo.
- Eh, pequeno, quem é que t’alagou?
E ele disse:
- É qu’ê caí acolá na cisterna. E o Senhô Espírito Santo na Cruz.
Que não este que tinha-se prometido a promessa. Era um outro. É quem d’ia agora desta freguesia pra lá, era a primeira casa, que chemava-s’à Cruz. A casa do Espírito Santo à Cruz.
E ele disse:
- Foi o Senhô Espírito Santo da Cruz. É que me tirou, qu’eu caí da cisterna abaixo. ‘Tava sobre a borda da cisterna e caí, e o Senhô Espírito Santo da Cruz é que me tirou.
Ora, eles vão ver. A áugua por lá fora, na pedra ond’ele tinha saído. À saída.
A mãe começa a gritare quTo seu filho que tinha caído na cisterna, qu’el’era tolinho. É que dizia.
E vem aquela gente toda ver, e ele disse:
- Home, ist’é porqu’alguém o tirou daqui.
E a mulhé dizia:
- Ó senhô, nã tirou, pois ê ‘tava lavando os outros. Quando acabei faltou este. Ê venho, ele vinha saindo ali da borda da cisterna, do poço, junto. Tamém nã estava ali, ainda à borda da cisterna? Ele já vinha pra cá.
Ficou tudo admirado. Mas eles ainda ficaram todos:
-Tiram o pequeno.
E larga-se.
E eles combinaram-se todos. As quatro coroas, que são quatro casas que ‘tão lá do Espírito Santo, qu’aquilo é a freguesia muito grande. É a à Cruz, é a à Terra Chã, é outra abaixo da Terra Chã, e é outra nas casas debaixo.
E o povo combinou-se e disse:
- Olha, amanha as quatro coroas vão d’ire todas.
Eles vão co’as coroas todas assim, pra ver.
E foram buscá o rapazinho, co’as coroas. Só estava a da casa dos pequenos, que era mais pequenina. Nã ‘tá a perceber? Mas as outras três eram igualinhas. Vocemecês se vinhessem agora c’uma aqui e dissesses: «Foi mesmo, vi esta coroa c’a outra, ist’é a mesma coroa que veio inda agora, é, sim, senhor», vocemecê d’ia mirá: “É”. As três eram igualinhas.
Foram chemar o pequeno. Eles já d’iam lá em cima. E ele disse:
- Home, qual foi daqueles o Senhor Espírito Santo que te salvou?
E ele disse:
- Olha, é aquele dacolá. É o Senhô Espírito Santo da Cruz.
Já o povo ficou-s’arrepiá, qu’o pequeno tinha dito.
Mas de repente eles, combinados, mandam pa trocar a coroa pra vere... E eles iam todos os mesmos, mas trocaro a coroa sem ele ver. Taparam-na de maneira pa…
E eles diziam pra outro e perguntavam:
- Home, qual foi o Senhô Espírito Santo que te salvou? Diz. Olha, vão acolá em cima.
E ele disse:
- Olha! Olha! Olha o Senhô Espírito Santo da Cruz!.. Olha, é aquele!
- Source
- FONTES, Manuel da Costa Portuguese Folktales in North America: New England , sem editora, s/d , p.#28
- Year
- 1978
- Place of collection
- Ponta Delgada, SANTA CRUZ DAS FLORES, ILHA DAS FLORES (AÇORES)
- Informant
- Guilherme Alexandre da Silveira (M),