APL 3300 Da Imagem de nossa Senhora do Socorro, do Convento de Odivelas
Em quatro de Agosto do anno de 1673. das seis para as sete horas da tarde estava a Madre Sor Maria da Assumpção, Religiosa professa de véo preto do mesmo Convento, diante da Imagem da Senhora do Socorro, de quem era mordoma muita antiga, dando principio à sua festa daquelle anno, que começava nas vesporas daquelle dia, que era vespora da Senhora das Neves. Esta Religiosa havia dous annos & meyo, que padecia huma terrivel ciatica, que a tinha toda tolhida de huma parte, & quasi aleijada; porque naõ podia dar hum passo: para esta queixa fez muitos remedios, & tomou por duas vezes suores, sem conseguir nenhũa melhora. Nesta tarde, & hora referida, lhe deu huma dor muito intesa, & queixandose à Senhora de permitir que ella padecesse tam vehemente dor no dia em que a festejava; no mesmo tempo desceo de repente a alampada, que diante da Senhora ardia, dando dous balanços muito grandes sem pessoa alguma lhe tocar, nem sahir da escapula em que estava presa. À vista deste sucesso, disserão duas Religiosas à mesma Madre Maria da Assumpção, que reparasse, porque aquelle sinal era que a Senhora do Socorro lhe oferecia o seu azeite para se untar com elle. Animada com esta advertencia, o fez assim, & de repente ficou licre de toda aquella vehemente dor, & do impedimento q’ tinha para andar, & ficou taõ livre, & desembaraçada, q’ logo pode ir à sua cella, que ficava bem distante do coro, aonde a Senhora estava, subindo para isto escadas bem compridas, tão ligeira, & desempedidamente, que causou a todas muita admiração: & da mesma maneira as tornou a descer para vir a buscar a Senhora, & a darlhe as graças pela perfeita saude, que lhe havia concedido: offereceolhe para perpetua memoria daquella maravilha, o bordão em que andava arrimada, & com que apenas podia dar hum passo; & quando o dava, era com muita difficuldade, & dor.
Depois que a Madre Maria da Assumpçaõ alcançou da Senhora do Socorro a saude perfeita, nunca mais sentio dor alguma naquella parte, que por tantos tempos a havia molestado. Não parou aqui a maravilha: porque depois de conseguir aquella Religiosa esta mercé da Senhora, começou a ferver o azeite da alampada em tanta quantidade, que sendo o vidro dos cõmuns, & estando meyo de agua, como se costuma fazer, tiráraõ todas as Religiosas daquelle Convento, que saõ muytas, azeite em vidros, tigelas, pucaros, & assim mais todas as moças, & criadas, que saõ innumeraveis, na mesma fórma, não havendo nenhuma, que naõ chegasse com a sua vasilha, sem o azeite parar. Durou esta perenne fonte de azeite por espaço de tres horas, & depois ficou a alampada acesa até o outro dia, sem haver necessidade de lhe lançarem novo azeite.
- Source
- AGOSTINHO DE SANTA MARIA, Fr. Santuário Mariano , Imperitura, 2007 [1711] , p.Tomo I, Livro II, Título XLVIII, pp. 414-416
- Place of collection
- Odivelas, ODIVELAS, LISBOA