APL 3658 Os mouros do Outeiro do Crasto

Há em Travassos, concelho de Montalegre, o Outeiro do Crasto, onde se dizia haver num penedo uma residência de mouros. À volta havia propriedades das pessoas da aldeia. E a sul havia um lameiro da família Custódio, uma das familias mais antigas de Travassos.
    Um dia uma menina desta família, chamada Teresa, andava com as vacas num lameiro, quando se abeirou dela um mouro, com palavras que ela não entendia. Por isso prometeu voltar no dia seguinte para lhas ensinar. Só que voltou uma vez, voltou outra, depois outra.., até que lhe arranjou um filho.
    Quando o filho nasceu, para que a família dela não soubesse, o menino ficou a viver na residência dos mouros, onde a mãe ia todos os dias dar-lhe de mamar. Um dia, estava ela a amassar pão em casa, quando uma amiga deu conta que lhe caía leite dos seus peitos na massa. E perguntou-lhe:
    — Que te aconteceu para estares a deixar cair leite na massa?
    Então ela não teve remédio senão contar-lhe.
    — Foi um mouro que no lameiro do Crastro abusou de mim e fez-me um menino. E depois ficaram-me com ele e eu tenho de ir lá todos os dias a dar-lhe de mamar. Em troca prometeram-me um balde de libras. Mas não digas nada a ninguém, se não eles matam-me.
    A outra prometeu e cumpriu, O tempo passou, e por fim, num certo dia, quando ela acabou de amamentar o filho, uma moura lá lhe deu um balde cheio para as mãos e disse-lhe:
    — Não olhes para dentro do balde enquanto não chegares a casa.
    Mas ela, cheia de curiosidade, não resistiu e olhou para dentro do balde. E viu lá, em vez das moedas de ouro que esperava, uma grande quantidade de tições, que começaram a arder mal olhou. Ela então atirou com os tições fora, mas dois ficaram agarrados ao fundo do balde.
    Quando chegou a casa, olhou para o balde, e os dois tições que lá estavam eram, afinal, duas moedas de ouro. Voltou logo atrás, a apanhar os tições que tinha deitado fora, mas quando chegou ao sítio já nada encontrou.
    Passado algum tempo, um irmão da moça, desconfiado das suas saídas diárias, resolveu vigiá-la, acabando por ir descobri-la a dar de mamar ao menino, tendo o mouro ao seu lado. Ao ver tal, foi tanta a ira com que ficou, que deu com um sacho na cabeça do mouro, matando-o. A seguir teve de fugir, porque se não os outros mouros matavam-no a ele. E disseram então os mouros à moça:
    — O menino fica aqui. E tu podes vir vê-lo sempre que queiras.
    Mas a família nunca mais a deixou ir. Diz o povo que durante muito tempo se ouviram bater os teares dentro do penedo do Outeiro do Crasto. Depois deixaram de se ouvir, pois os mouros foram-se embora. Só que antes de partirem deixaram lá uma avultada riqueza para a Teresa.
    Diz-se ainda que há lá duas entradas que os mouros utilizavam, uma do lado sul e uma subterrânea do lado norte, por onde saíam para irem à água à beira dos moinhos do professor de S. Vicente.

Source
PARAFITA, Alexandre A Mitologia dos Mouros: Lendas, Mitos, Serpentes, Tesouros , Gailivro, 2006 , p.299-300
Year
2001
Place of collection
Covelães, MONTALEGRE, VILA REAL
Informant
António Joaquim Gonçalves (M), 56 y.o.,
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography