APL 2815 As filhas encantadas em duas pedras
Mas olhe que isto foi verdade. Contava a minha mãe (Deus lhe perdoe) que houve um homem, um senhor cá, não é? E tinha duas filhas. E encantou-as numa pedra. Numas pedras largas. Eram duas. Só ficou uma depois, porque vais ouvir. Então encantou em duas pedras.
Andaram por ali aquelas pedras, porque antigamente… o senhor não sabe mas não sei se ouviu dizer: ia-se buscar uma pedra para se por em cima de uma agrade para se agradar a terra para depois semear, não é? Toda a gente por ali, os vizinhos daquelas propriedades, iam buscar as pedras para agradar. (A minha mãe, lá Deus lhe perdoe, não tinha animais mas punha um capão de vidros e punha a pedra por cima para arrasar no Vale da Barca os feijões; para fazer a grade.) Então houve um pobre daqui que foi para a terra lá desse homem, aonde estava. E em modo de conversa, começou a falar e disse:
- Olhe, o senhor de onde é?
- Olhe, eu sou de Carlão.
- Olhe, o senhor conhece, assim-assim, um lugar que lhe chamam o Vale da Barca?
- Conheço muito bem.
- Olhe, sabe que lá há assim duas pedras muito grandes, assim umas pedras muito asadas, muito espalmadinhas, e tal…
- Sim, sim, há.
- Então olhe, eu vou-lhe dar dois bolinhos e o senhor põe um em cada pedra, que o senhor fica rico para toda a sua vida e mais os seus familiares.
O homem, coitado, lá trouxe os dois bolinhos. Mas chegou a casa, a mulher, com certeza, tirou-lhe um bocado de um. Ele agarrou e foi lá. Botou então um inteiro a uma e outro já com um bocado tirado; diz que eram dois cavalos. O que teve as quatro patas, fugiu. O outro, só tinha três, ficou. Ainda andou por ali muito tempo, isto depois foi contado. Até que depois mais tarde desapareceu. Lá depois tornou a pôr outro, com certeza. O que sei é que as pedras desapareceram completamente, nunca mais se viram.
Colector: As duas?...
Informante: As duas pedras! Portanto… Eu, assim Deus Nosso Senhor me salve a minha alma, há uma casa aqui – olhe que é aquela ali acima – eu nova, tinha para aí o quê? Os meus dez anos. Andei mais de um ano… – já te contei isto, não já? – Andei mais de um ano! A pedra levantava e eu via um baú destes, como há… Pronto, agora já se não vê. Mas eram estes baús que havia e que se abria assim a tampa… Abria-se esse baú: cheiinho de libras! E (com licença do senhor, que vou contar tal e qual, que era mesmo assim) um padre – era mesmo vestido de padre – (com licença) com cornos! Andei mais de um ano! Olhe que eu acordava assim! Olhe… De ver assim ali aquilo. Depois era o padre e duas mulheres. O padre chamava-me e as mulheres batiam as palmas. Depois deixou de ser ali na pedra. Era adiante – tu sabes bem os valados que havia de vinha, do Zé Grilo, onde está a creche? Aí eram valados de vinho. Abria-se assim uma cova, e ao mesmo baú com as libras. Tornavam. Mas ele sempre com os chifres. Até que por fim eu contei depois mais tarde isto ao meu avô e a um padre onde eu estive a servir, que estive a servir no Padre Vital, contei-lhe isto, diz: Raios te partam, vinhas aqui, íamos lá à meia-noite, que a riqueza tiramo-la! E ao meu avô disse que morou ali um padre na tal casa e que tinha muito, muito, muito… pronto, muitos haveres e ouro e com certeza… pois que ele o deixou, ninguém enterrou. Mas olhe que isto passou-se comigo, foi verdade.
- Source
- AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) , n/a,
- Place of collection
- ALIJÓ, VILA REAL
- Collector
- António Fontinha (M)
- Informant
- Natália de Jesus Veiga (F), 71 y.o.,