APL 1522 Castello ou S. Thomé do Castello
Um castelo encerra em si numerosas riquezas encantadas, guardadas por ídolos monstruosos que, até aqui, têm conseguido afastar os aventureiros que buscam tais riquezas.
Não podiam deixar as ruinas d’este vetustissimo castello de ter suas lendas e contos de mouras e thesouros encantados; e o nosso bom povo, cuja imaginação é tão fertil n’estas coisas, traz ligadas a estas ruinas, historias pavorosas e horripilantes.
Ahi vão as principaes.
D. Taludo e seus antecessores possuiam riquezas hyperbolicas, que tinham escondido em uma especie de tunnell que mina o picôtto, na Fonte dos Louranços (a uns 60 metros do castello) – na Fraga dos Sabugueiros, onde se vê uma mão esquerda, por baixo da qual, diz o tombo ou roteiro, estão as armas de D. Taludo, e onde era a morada de D. Martha; na Fraga da Torre, onde ainda se vêem os alicerces de um edificio, que se diz ter sido torre, e era o carcere dos prisioneiros e delinquentes. Dista 900 a 1:000 metros do castello. Por estes sitios, diz o tombo, se encontrarão as joias de um rei.
Tendo já fallado n’esta obra em roteiros (a que nas provincias do N. chamam tombos) é preciso dizer aos leitores que o ignorarem, que roteiro é um quaderno manuscripto que diz os sitios onde estão os thesouros encantados e a maneira de os desencantar. Já se sabe, os taes roteiros não passam de um logro.
Fiados nos taes tombos, muitos teem tentado desencantar thesouros, por meio de livros magicos (dizem que escriptos por S. Cypriano, antes da sua conversão) e com rezas dos padres, que para isso alli teem levado.
Diz-se que de uma vez acharam algumas riquezas. Que por outra vez, depois de muito trabalho nocturno, e estando mettidos todos dentro de um grande sino saimão (signo de Salomão) lhes appareceram figuras diabolicas e idolos monstruosos e medonhos, mas riquissimamente vestidos de oiro e de diamantes, que brilhavam como o sol, a cuja vista os ambiciosos desencantadores ficaram aterrados e fugiram espavoridos.
Junto á porta do castello que olhava para o N., consta que havia antigamente um buraco, por onde facilmente podia entrar um homem. Diz-se que ha annos por elle entraram varios individuos audaciosos, os quaes a poucos passos da entrada viram uma abobada de cantaria lavrada e depois umas escadas de uns 16 a 20 degraus, ao fim dos quaes se seguia uma estreita galeria até um largo onde estava um bello jardim com um elegante chafariz.
Mais adiante estava outro largo, e n’elle um sumptuoso templo pagão, todo ornado de ouro e pedrarias, com idolos medonhos e ameaçadores que lhe faziam terriveis esgáres. Os pobres fugiram espantados, e poucos dias sobreviveram á sua temeraria empresa.
Consta que os principaes chefes d’esta expedição foram Gonçalo Esteves e Paulo Mondes, da referida aldeia de Mascusinhos, arruinada.
E lá jazem encantados os famosos e riquissimos thesouros dos antigos possuidores do castello!
- Source
- PINHO LEAL, Augusto Soares d'Azevedo Barbosa de Portugal Antigo e Moderno , Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 2006 [1873] , p.tomo II, p. 170-171
- Place of collection
- São Tomé Do Castelo, VILA REAL, VILA REAL