APL 279 A Pombinha
Ha já muitos anos faleceu uma mulher em Mação, deixando uma filha que vivia com seu pai.
Este possuía uma horta no sitio do Vale Longe, vale muito fundo, rodeado de pinhais, que lhe dão um aspecto triste e misterioso. Em um dia, indo a filha á mesma horta colher hortaliça, viu sair dos pinhais uma pomba de côr escura, que, esvoaçando ao redor dela, ora se adeantava, ora se atrasava, até que desapareceu nos pinhais, dando gemidos.
A rapariga assustou-se; mas não disse a ninguem o que lhe sucedera. Por mais duas vezes foi ao Vale Longe e sempre acontecia a mesma coisa, chegando a pomba por fim a pousar sobre o cesto da hortaliça que ela trazia á cabeça; por isso, ao chegar a casa, contou ao pai tudo o que lhe sucedera e disse-lhe que não voltava mais ao Vale Longe. O pai, impressionado com a narrativa da filha, aconselhou-a a que voltasse ao Vale Longe; que nada temesse porque ele a seguiria de perto para a afoitar e que ao aparecer-lhe a pomba preferisse as palavras que se costumam proferir quando alguma aparição misteriosa ocorre.
Assim foi. No dia seguinte lá foi a rapariga para a horta, aparecendo-lhe a pombinha escura, á qual ela disse: «Se és alma do outro mundo dize o que queres que se te faça, mas se és o demonio eu t’arrenego em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo!» benzendo-se ao mesmo tempo.
E logo a pomba lhe disse: «Eu sou a alma de tua mãe e não posso entrar no Ceu por não ter cumprido a promessa de mandar dizer uma missa ao Divino Espírito Santo, na sua capela. Peço-te que mandes dizer essa missa para eu poder gosar da bemaventurança eterna.»
A filha disse depois ao pai o que acontecera, mandando-se logo no dia seguinte dizer a missa na capela do Espirito Santo, durante a qual a rapariga viu a mesma pomba andar esvoaçando ao redor do padre que a dizia, vendo mais que, finda a missa a pomba escura se transformou em pomba branca como a neve, vindo pousar-lhe no colo, beijando-a e levantando vôo sumiu-se subindo pelos ares fóra.
Era a alma da mãe que, agradecida, a beijava e agora já livre de encargos ia ver a face de Deus.
- Source
- SERRANO, Francisco Elementos Históricos e Etnográficos de Mação , Câmara Municipal de Mação, 1998 [s/d] , p.157-158
- Place of collection
- MAÇÃO, SANTARÉM