APL 1827 Lenda das Mouras de Salir

Havia já há longos anos um castelo em Salir, que ainda hoje lá existe[m] as ruínas, chamadas as ruínas do castelo. E habitava lá um rei mouro, árabe, que tinha duas filhas. E, naquele tempo, o que se conta, quando alguém desobedecia, pois o rei (fazia) encantava as filhas, ou qualquer outro, outra pessoa ou animais, ou coisas assim.
 E então, aqui pelo caminho de Salir, até chegar aqui aos Palmeiros, encontra-se a fonte do ouro. Uma fonte que, por sinal, não é de ouro, mas no tempo onde não há água nenhuma em água nenhuma, ela continua a ter água sempre, sempre, sempre, que podem tirar-lhe água de dia e de noite, que ela nunca se seca.
 E então, aí nessa fonte, estavam duas princesas encantadas, filhas desse rei mouro. E, um certo dia, vinha de Salir um rapaz e passou por ali, na volta da meia-noite (e), quando viu uma linda princesa a pentear-se com um pente de ouro. E ele parou, pasmado com aquilo que estava a ver, e disse assim:
 - Mas que encanto! Tanta riqueza e que linda, e que linda rapariga!
 Ela olhou para ele e disse:
 - Olha, se me libertares deste encantamento em que eu estou aqui a viver, mais a minha irmã, eu, para além de te dar o pente, ainda te dou toda a riqueza que eu possa ter. Mas, para isso, tens que me prestar um grande favor, muito grande: amanhã de manhã, vens aqui antes do sol nascer, que vais encontrar uma junta de bois e um arado. Vais até à igreja de Salir, que [fica] junto do castelo, e dás um rego direito em direcção aos Palmeiros. Não olhas para lado nenhum; nem que vejas as maiores riquezas, nada te deslumbre. Continua o teu trabalho sempre em frente, sem te preocupares. Se conseguires fazer isso, ficas com toda a riqueza que eu te vou dar e eu fico livre deste encantamento em que tenho estado a viver.
 Então, o rapaz com aquela promessa ficou deslumbrado e no outro dia, de manhã, lá foi. Exactamente tudo como a princesa lhe tinha dito ele encontrou. Foi, voltou para trás, foi a Salir, veio e continua tudo muito bem. Aí a uns cem metros dos Palmeiros, o arado encalha numa parte que ele pensou que fosse uma pedra, e dali estilhaçou bocados de ouro por tudo quanto era lado. E ele ficou pasmado com aquilo tudo e disse assim:
 - Então, e eu agora vou perder toda esta riqueza que tenho aqui na frente e depois não sei o que é que vou encontrar que seja mais valioso que isto que está aqui ou que a princesa me vá dar que seja mais valioso. E com o há um ditado que diz “É melhor um pássaro na mão que dois a voar”, e eu vou mas é já arrecadar isto tudo que eu tenho aqui na frente.
 E, enão, pára os bois. Não dava mãos a medir em apanhar bocados de ouro e meter dentro dos bolsos. Só quando ele acabou de guardar as coisas, olhou para a frente, os bois já lá não estavam, o arado também já lá não estava, e joga as mãos às algibeiras, tudo o que ele tinha posto também já lá não estava.
 Portanto, ficou completamente pobre com estava e a princesa ficou no mesmo encantamento, igual. E então, a história fica baseada até um certo ponto… a ambição dele não deixou terminar as coisas até ao limite daquilo que a princesa lhe tinha dito. E, então, continuou no mesmo encantamento. Provavelmente, hoje ainda existirá. E até, dentro dessa história toda, a minha avó contava que havia certas pessoas que nunca deixavam chegar a fazer a meia-noite, porque alguém que lá passou, também na mesma direcção Salir - Palmeiros, e que viu lá essa dita rapariga. Isto aconteceu, ninguém sabe quando é que… se calhar em 1400, ou qualquer coisa assim parecida, dessa época. E, agora, isto já a minha avó contava, que alguém que tinha visto essa dita rapariga. Só que o medo era tanto que acabavam desviando de passarem lá e, se alguma vez a podiam libertar, e se realmente esta história foi verdadeira, nunca deixavam chegar ao final, porque as pessoas tinham medo e já não passavam por lá.

Source
AA. VV., - Arquivo do CEAO (Recolhas Inéditas) , n/a,
Year
1999
Place of collection
Salir, LOULÉ, FARO
Collector
Sónia Santos (F)
Informant
Cremilde Lourenço (F), 57 y.o., born at Salir (LOULÉ),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography