APL 224 Lenda da mina dos mouros
Conta-se que um lavrador do lugar de Crasto, Perosinho, mandava as suas vacas dia a dia ao dito Monte Murado em busca de pasto.
Sucedia que uma delas regressava com aspecto magnífico, muito bem alimentada, mas quase sempre inteiramente mungida.
O facto, por sistemático, causava ao lavrador a maior estranheza, sem descobrir explicação para o acontecimento.
Por isso, um dia, decidiu acompanhar as vacas na sua digressão para apurar a razão de ser do evento.
Subiu ao monte, seguindo-as, e em dado momento viu a vaca que o trazia encismado e apreensivo deixar a companhia das outras e derivar para um caminho diferente, fazendo sozinha a escalada do monte.
O lavrador, atento, deixou que ela escolhesse o caminho e agarrou-se-lhe ao rabo para trepar com mais facilidade e não a perder de vista.
Ao atingir um ponto mais encoberto, a vaca introduziu-se numa fenda existente entre dois penedos, seguindo por uma mina em plena escuridão.
Ao cabo de alguns metros atingiu um lugar cheio de luz, onde se estadeavam lameiros verdejantes, com belas pastagens e maravilhosos frutos.
Como se fora uma região mágica e paradisíaca, havia ali um extenso pomar capaz de excitar a cobiça do mais saciado.
O povo explicava que naqueles sítios habitavam os mouros, donos e senhores daquelas paisagens subterrâneas.
À vista de todo aquele encantamento e, passada a impressão daquele momento extraordinário, o lavrador pôde então desvendar e esclarecer todo aquele mistério que tão intensamente o intrigava.
Ao encontro do animal surgiu um mouro que viera mungir a vaca, ficando esta depois a banquetear-se nas ricas pastagens que tinha ali ao seu dispôr.
Mas, o mouro, dando pela presença do lavrador, increpou-o com aspereza por se ter aventurado a penetrar naqueles secretos domínios, fazendo-lhe sentir que nenhum mal lhe faria por ser a primeira vez que lá ia.
Todavia, preveniu-o de que se voltasse teria de arrepender-se, sem remédio.
Mas, fazendo conta ao prejuízo diário que lhe causava com o mungir da vaca, logo informou de que tudo lhe seria pago.
E, de seguida, apontando o pomar, convidou o lavrador a apanhar as laranjas que quisesse e a afastar-se sem discussões.
O dono da vaca, mal refeito do susto, cortou algumas laranjas, poucas, que guardou, retirando-se depois na companhia daquela vaca estranha.
Esta, posteriormente, continuou a subir o monte em busca da pastagem, sendo certo que o lavrador nunca mais se preocupou com as suas sortidas.
Em certa altura o lavrador pretendeu comer uma das laranjas e ficou estupefacto ao verificar que se tratava de grandes bolas de ouro.
Diz-se ainda que a vaca trouxe para casa uma grade e um jugo do referido metal precioso, enriquecendo o lavrador.
O povo do lugar, fundado na lenda, explicava assim a abastança de certa família de Perosinho, bem conhecida.
- Source
- VALLE, Carlos Revista de Etnografia, Tradições Populares de Vila Nova de Gaia , Junta Distrital do Porto, 1965 , p.128-129
- Place of collection
- Perosinho, VILA NOVA DE GAIA, PORTO