APL 1927 [A moura da mina]

(Há um segundo tio meu, contou-me a esposa dele, a tia Piedade).
O marido encontrava muitas mouras.
 Um dia, uma moura disse-lhe à eira das casas para ele lhe dar um beijo na boca; que ele lhe desse um beijo na boca que ela se transformaria na esposa dele.
A moura diz que lhe disse:
- Olha, dá-me um beijo na boca que depois eu...
Ele diz que passava ali todos os dias para ir para a mina, a pé, e encontrava aquela mulher muito linda a pentear os cabelos. E ele então dizia-lhe:
- Olha, tu és linda. Quem és tu? E quem não és tu? De onde é que vens para seres tão bonita?
E ela, um  dia, diz-lhe:
- Dá-me um beijo na boca e eu transformo-me na tua mulher. A tua mulher ficará com a minha aparência.
Mas ele diz que não estava para trair o matrimónio não lhe deu o beijo na boca. Não lhe deu o beijo na boca e foi embora. Não quis dar o beijo na boca nem tocar e foi embora.
 Acontece que chegou à porta da mina encontrou outra vez a moura. E a moura disse-lhe:
- Já que não me quiseste dar o beijo na boca vais ver onde é que eu vivo. Pega este carrinho de linhas e entras para dentro da mina porque depois do buraco onde tu trabalhas há uma outra galeria. Há umas escavações, uma gruta que é nesse lugar que eu vivo. Se me deres um beijo, se me abraçares eu trago-te para a rua, mas se não me abraçares, vais ter de regressar enrolando o carrinho das linhas ao contrário.
Ele diz:
- Está bem, pode ser que eu quando chegar ao lugar em que tu vives já te possa dar o beijo. E o que é que tens nessa gruta?
- Ah, tenho muitas riquezas. Vais ver que tu vais gostar muito e eu vou ficar tua mulher. Se me deres um beijo, eu fico tua mulher, mas se não me deres o beijo vem ver onde eu vivo que eu depois dou-te o tesouro.
E lá vai o homem da Celeste. E a tia conta depois a história que o marido lhe contou.
 Que ele pegou no carrinho das linhas e foi para dentro da mina e não foi trabalhar. Foi, foi e desenrolou o carrinho, desenrolou, desenrolou, desenrolou e que depois encontrou uma gruta; só que à procura do tesouro ele perdeu-se. Nunca encontrou tesouro nenhum. Ele perdeu o fio à meada, (como se costuma dizer), o carrinho das linhas acabou-se (imagine o que ele deve ter andado dentro das minas! Palmilhou terreno, terreno e mais terreno. Falo-lhe, portanto das minas da Panasqueira, que as serras estão todas cheias de escavações de grutas feitas a propósito de encontrar o minério- que eu sou filha de terras mineiras).
 E o tio Zé António encontrou a tal gruta mas para depois enrolar o carrinho ao contrário já tinha perdido a linha e o fio à meada. Perdeu-se então.
 E a tia Piedade conta que nunca trouxe tesouro nenhum lá para casa e que andaram três dias à procura do tio Zé António. E o tio Zé António voltou para casa tão pobre quanto foi, ainda por cima perdeu o sonho da moura. 

Source
AZEVEDO, Ana A Literatura Oral na Comunidade Emigrante Portuguesa em Montreal , Universidade do Algarve, 2002 , p.# 110
Year
2001
Place of collection
São Jorge Da Beira, COVILHÃ, CASTELO BRANCO
Informant
Adelaide Ramos Vilela (F), 47 y.o., born at São Jorge Da Beira (COVILHÃ),
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography