APL 1311 A Encantada no Poço da Ponta
Antigamente, na Terceira, havia vários poços de maré, à volta da ilha, perto da rocha do mal. Havia poços desses no Porto Martins, no Cabo da Praia e na Salga, no Calhau da Ponta. Não se pensava ainda em água canalizada e havia pouca água de fontes. Por isso ia ali muita gente buscar água para tratar dos animais ou mesmo para lavar a roupa.
Era no Poço do Calhau da Ponta que costumavam aparecer os encantados, gente que se sumia e vivia debaixo do mar. Apareciam, às vezes, em diversos lugares perto do litoral, mas não era para toda a gente ver. Eram lindos, lindos como o sol.
Por volta de mil novecentos e trinta, uma vez o Manuel Toste estava no Poço da Ponta, que ficava por trás da Fonte da Areia dá Ponta, a tirar água para o gado. Atirou o balde para o poço, puxou-o para cima e, quando se foi voltar para despejar a água na pia para o gado, viu uma moça muito bonita que lhe perguntou:
— Há água pra beber?
— Há, sim senhora. E só esperar — respondeu o Manuel Toste, mas muito admirado com aquela rapariga desconhecida, ali, em busca de água.
Como tinha acabado de despejar a água do balde, voltou a deitá-lo ao fundo do poço, deu um balanço e começou a puxar pela corda. Veio para trás para dar água à moça, mas já não a viu. Apercebeu-se, porém, que ela tinha bebido água pela tampa de uma caneca em que ele ordenhava as vacas, porque a tampa estava fora do bocal da caneca, posta em cima da borda da pia com um resto de água dentro.
O homem ficou muito nervoso, julgando, por instantes, que a rapariga tinha caído dentro do fundo poço. Vendo que isso era impossível porque tinha estado sempre ao pé da boca do poço, ficou então certo de que era um dos encantados que costumavam aparecer naquele lugar.
Muitas outras vezes foi ao poço tirar água para o gado, mas nunca mais viu os encantados, embora outras pessoas os tivessem encontrado e se tivessem apercebido que eram sempre lindos como o sol.
- Source
- FURTADO-BRUM, Ângela Açores: Lendas e outras histórias , Ribeiro & Caravana editores, 1999 , p.140-141
- Place of collection
- Angra (Sé), ANGRA DO HEROÍSMO, ILHA TERCEIRA (AÇORES)