APL 746 Lenda de Ardínia (D)

No tempo em que os mouros dominavam este território, vivia no castelo de Lamego um rei que tinha uma filha muito bela, de nome Ardínia, que o pai destinara a casar com um príncipe mouro de uma terra vizinha. Por isso, andava sempre de olho nela para que jamais chegasse a conhecer qualquer outro jovem, e menos ainda os jovens cristãos que ia ganhando fama em actos heróicos nas lutas contra os mouros.
 Um desses jovens era Dom Tedo. Falava-se dele em toda a região do Douro, pois eram notáveis os seus feitos e a sua valentia a libertar aldeias e vilas do domínio dos mouros.
 O eco da sua fama chegou também até Ardínia que, secretamente, passou a alimentar a esperança de o vir a conhecer. E um dia, perante o descuido do rei mouro, o encontro aconteceu. Dom Tedo não resistiu então à beleza da moura e, sabendo-a prometida a um casamento que ela não desejava, propôs-lhe que soltasse as amarras e o aceitasse a ele para esposo.
 Ardínia fechou-se no castelo e pensou, pensou, durante dias e dias. Tinha consigo um grande dilema: continuar submissa à sua fé e aos desígnios paternos, ou voar para o amor que Dom Tedo lhe prometera.
 Por fim, decidiu-se. O coração falou por ela. E um dia, sabendo que Dom Tedo assentava arraiais no mosteiro de São Pedro das Aguias, em Tabuaço, Ardínia partiu para lá.
 Ao chegar ao mosteiro, o noivo não estava. Foi recebida pelo pároco de Paradela que, ao saber ao que ela vinha, logo a preveniu de que nada conseguiria enquanto se mantivesse moura, ou seja, enquanto não recebesse o sacramento do baptismo. Ela aceitou o desafio e o próprio padre anfitrião a catequizou e baptizou.
 Entretanto, o rei mouro, sabendo da fuga e do rumo que Ardínia levou, partiu em sua perseguição. Ao dar com ela no mosteiro e ao saber da sua conversão, logo aí a degolou sem dó nem piedade, lançando o corpo ao rio Távora.
 Dias depois chegou Dom Tedo e, ao inteirar-se do cruel destino da jovem amante, decidiu tomar o hábito de monge vivendo em exclusivo para a sua fé até ao fim dos seus dias.
 E não foram muitos esses dias. Conta-se que o rei mouro, à frente de grande número de soldados, lhe lançou uma perseguição vingadora, acabando por matar Dom Tedo numa ribeira próxima, cujas águas ficaram de tal forma tingidas com o seu sangue que o povo acabaria por lhe dar o seu nome ribeira do Tedo. E daí também aquele lugar passar a ter o nome de Granja do Tedo.
 Diz ainda a tradição que, quando o nevoeiro do rio Távora sobe pela colina e vem cobrir as pedras do mosteiro, Ardínia e Tedo vêm no meio dele viver os seus amores mais íntimos nos refúgios das escarpas.

Source
PARAFITA, Alexandre Património Imaterial do Douro - Narrações Orais (contos, lendas, mitos) Vol. 1 , Fundação Museu do Douro, 2007 , p.150-151
Year
2006
Place of collection
Granja Do Tedo, TABUAÇO, VISEU
Informant
Alexandre Parafita (M),
Narrative
When
2006
Belief
Some Belief
Classifications

Bibliography