APL 3438 Senhora da Estrella
Grande ermida, Beira Alta, na aldeia de Boaças, freguezia de S. Miguel de Oliveira do Douro, concelho e comarca de Sinfães.
[…]
Na festividade d’agosto de 1879, teve logar um facto, que deu muito que pensar – mesmo aos incredulos.
Projectou-se e levou-se a effeito, uma procissão pelo Douro, em barcos luxuosamente enfeitados (que em verdade produziam lindo effeito), na qual eram conduzidos alguns andores, entre elles o da Senhora da Estrella. Depois de percorrer uma certa distancia, desembarcou a procissão no sitio do Portantigo, onde devia de ter logar um sermão.
Effectivamente, chegados que foram todos á praia, principiou o sermão, que era escutado com interesse. Porém, no meio d’aquelle povo respeitoso e submisso, lá estavam alguns individuos que… se conservaram de chapeu na cabeça, apesar de serem avisados e rogados para se descobrirem.
Notaram tambem o digno abbade da freguezia e o rev.º prégador, o escandalo que os taes individuos estavam dando, pelo que este ultimo sr. teve por conveniente fazer-lhes algumas observações amigavelmente; mas não foi attendido.
Dirigiu-se então alguem, em termos cortezes, a um barbeiro, de S. Cypriano, cujo nome ainda ignoro, pedindo-lhe que tirasse o chapeu, ao que elle respondeu: «custou-me dinheiro e comprei-o para o ter na cabeça». Mal eram pronunciadas estas palavras e terminada uma supplica á Virgem pelo digno abbade, e eis que um grande mastro, erguido para o objecto da funcção, cáe e mata instantaneamente uma filha do teimoso barbeiro, deixando tambem este bastante confuso, que por isso foi conduzido em braços para casa.
Foi castigo? Foi méro acaso? Aos que forem d’esta opinião direi que no dia antecedente, um homem tinha trepado pelo mastro, indo collocar-lhe no cimo uma bandeira, e desceu muito a salvo.
Todavia o facto deu-se como acabo de narrar, e todos aquelles que presenciaram a teimosia do barbeiro e a lamentavel occorrencia que se lhe seguiu, ficaram contristadissimos, e não raro sahia de muitas bocas esta expressão — Foi a justiça Divina que castigou o pouco respeito á Santa Virgem.
E todo aquelle povo ficou dando graças a Deus por não ter havido mais victimas, sendo certo que ao pé do barbeiro e de sua filha havia muita gente reunida quando cahiu o mastro.
- Source
- PINHO LEAL, Augusto Soares d'Azevedo Barbosa de Portugal Antigo e Moderno , Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 2006 [1873] , p.Tomo IX, p. 108
- Place of collection
- Oliveira Do Douro, CINFÃES, VISEU