APL 3319 Melgaço

D. João I, em pessoa, pôz cêrco a Melgaço. Havia dez dias, que o assedio durava, sem outra consequencia mais, do que escaramuças, que nada decidiam.
    […]
    Dentro da praça havia uma mulher muito valente, parcial dos castelhanos, que renegára a sua patria, pois era d’aqui mesmo natural.
    Sabendo ella que no arraial dos portuguezes estava uma sua conterranea, ousada e valorosa como ella, a mandou desafiar a um combate singular. Ignez Negra (a desafiada) acceitou o repto, e se dirigiu logo para o ponto designado, que era a meia distancia do arraial e da villa. Já lá estava a arrenegada, (como então se dizia) e o combate começou encarniçado, terrivel e desesperado, como duas viragos, ferindo-se com as mãos, unhas e dentes, depois de partidas as armas de que vieram munidas.

    Antiqua arma, manus, ungues, dentesque feruntur.

    A aggressora ficou debaixo, e teve de retirar para a vilia, corrida, ferida, e quasi sem cabello «levando nos focinhos muitas nodoas das punhadas da de fóra» que ficou victoriosa.
    Os portuguezes fizeram grande algazarra aos castelhanos.
    No dia seguinte era a praça dos portuguezes, e Ignez Negra, cercada de bésteiros, eatava no alto da platafórma, onde o pendão das Quinas ondeava ovante, no mastro em que na vespera se ostentava orgulhosa a bandeira dos leões e torres de Castella, e dizia no seu transporte de alegria – «Mas vencemos-te! Tornaste ao nosso poder. És do rei de Portugal!»

Source
PINHO LEAL, Augusto Soares d'Azevedo Barbosa de Portugal Antigo e Moderno , Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 2006 [1873] , p.Tomo V, pp. 169-170
Place of collection
MELGAÇO, VIANA DO CASTELO
Narrative
When
20 Century,
Belief
Unsure / Uncommitted
Classifications

Bibliography