APL 1076 O pisco escrivão
Deus estava na fase de ordenação do Mundo que acabara de criar. E pela sua frente, e de S. Pedro, iam desfilando os animais, cada qual mencionando as suas preferências.
Chega-lhes então o pisco, uma avezita quase minúscula, de corpo coberto de peninhas fofas, castanhas ou quase acinzentadas. A barriga branca ou de um branco sujo, não chegava para lhe dar porte e airosidade suficiente, ou mesmo arrancá-lo à mediocridade a que parecia condenado.
Chegado, e com o ar mais simples possível, diz ao criador:
- Eu quero ser escrivão.
- Escrivão tu? Pergunta-lhe admirado S. Pedro.
- Escrivão sim, tens medo que te tire o lugar? Perguntou o passarito.
- Não, não tenho medo. Gritou S. Pedro, espetando profundamente o aparo da caneta na garganta do bicho.
A ferida sangrou e veio manchar de um amarelo torrado o branco do pescoço e do peito.
Para que todos vissem e jamais esquecessem o pedido estúpido que fizera marcou-o Deus, a si e aos seus descendentes, com a mancha sanguinolenta.
- Source
- HENRIQUES, Francisco Contos Populares e Lendas dos Cortelhões e dos Plingacheiros , Associação de Estudos do Alto Tejo, 2001 , p.37-38
- Place of collection
- PROENÇA-A-NOVA, CASTELO BRANCO
- Collector
- Francisco Henriques (M)
- Informant
- Luis Henriques (M), PROENÇA-A-NOVA (CASTELO BRANCO),